sexta-feira, maio 30, 2008

A vida e morte de Luisa Rosa de Aguiar

Nasceu numa família de poucos recursos, tornou-se rica e célebre! Foi idolatrada!

Em criança, salvou-se de morrer soterrada porque se escondeu dentro de um forno de pão!

Em adulta, salvou-se de morrer afogada no Douro porque lhe alcançaram um remo a que se agarrou!

Depois de conviver com reis e imperadores por toda a Europa, morreu pobre, em Lisboa, e a sua sepultura encontra-se esquecida, debaixo dos alicerces de um edifício na Rua do Alecrim!

Por casamento tinha adquirido o sobrenome por que ficaria conhecida: Todi.

Luísa Todi, é de quem venho falar hoje!

Luisa Todi



Luísa foi a terceira filha de um modesto professor de música que, com 5 bocas para alimentar, resolveu deixar a cidade de Setúbal e partir para Lisboa onde arranjou trabalho como copista de orquestra no teatro do Bairro Alto.

Nascida em 1753, conta-se que se terá salvo do terramoto de 1755 por se ter escondido dentro de um forno de pão que lhe serviu de protecção.

Com a vinda do seu pai para Lisboa, Luísa e as suas 2 irmãs conhecem a realidade teatral e deixam-se deslumbrar por ela. Todas virão a ser actrizes e cantoras de primeira grandeza!

Luísa estreia-se num pequeno papel de Tartufo de Moliére, enquanto a sua irmã, Cecília, tinha o papel principal.

Com a vinda a Lisboa de uma companhia italiana de Ópera, Luísa e o 1º violino da respectiva Orquestra apaixonaram-se e casaram. Tomou assim Luísa o apelido de seu marido, Saverio Todi!

Depois de um período de 6 anos a residir no Porto, com a preparação obtida por intensas aulas de canto e muitas actuações, inicia a sua carreira fora do País.

Primeiro em Londres, ainda algo imatura e com um sucesso muito limitado, mas depois por Espanha e Paris onde triunfa.

Aí, em Paris, participa nos Concertos Espirituais, que se realizavam regularmente no Palácio das Tulherias e logo na sua primeira apresentação causa uma impressão tal que a notícia se espalha como fogo na alta sociedade francesa, que acorre em massa às récitas seguintes que se esgotam imediatamente.

Palácio das Tulherias - O pavilhão central era a zona de concertos



Passa igualmente a ser presença regular em Versalhes onde faz os chamados Concertos da Rainha.

Todi, nessa altura, começa a receber convites irrecusáveis de toda a parte e o empresário dos Concertos Espirituais, para a prender, cria um fenómeno de diversão, que depois veio a ser utilizado futuramente para promover a popularidade de outras cantoras:

Convida para os seus Concertos Espirituais a grande cantora alemã Gertrude Elisabeth Mara .


Simultaneamente, com esse convite, põe a circular o boato de que existe uma enorme rivalidade entre ambas e fá-las actuar alternadamente nos seus Concertos.

O público acorre em avalanche, os críticos apenas sabem dizer que ambas são magníficas e chegam a formar-se dois partidos, Os Todistas e Os Maritistas.

O assunto torna-se o principal tema de debate nos salões da capital francesa. No final, Luísa Todi acaba por vir a ser considerada pelos franceses como “A Cantora da Nação”.


Luisa Todi considerada pelos franceses como a "Cantora da Nação"



Contudo, Paris e Itália, onde também actuava regularmente, já não chegavam para Luísa Todi que, sendo uma admiradora da Imperatriz Catarina II da Rússia, parte para aquele país, mesmo sem ter contrato, bastando-lhe a palavra do director dos Teatros Russos, de que poderia fazer dois espectáculos para a Imperatriz.

Diz-se que o espectáculo de despedida de Paris foi um acontecimento nunca visto e não mais repetido. Houve uma loucura colectiva na aquisição dos ingressos, que atingiram preços astronómicos e no final da sua apresentação, com as flores e os presentes recebidos (entre os quais inúmeras jóias), Luísa Todi encheu completamente duas salas.

A sua estadia em São Petersburgo foi também um sucesso (as duas récitas inicialmente previstas transformaram-se em quatro anos de permanência), mas foi um sucesso algo atribulado! Logo após o primeiro espectáculo, Catarina II ficou tão impressionada, que nomeou Todi professora de canto das princesas imperiais criando a inimizade do até então conselheiro musical da corte russa, o compositor italiano Giuseppi Sarti.

Giuseppi Sarti



Para tentar desmoralizar Todi junto da Imperatriz, Sarti teve a ideia de chamar à Rússia o castrati mais famoso da época, chamado Marchesi, que foi considerado o sucessor do grande Farinelli.

A ideia era colocar os dois lado a lado, de forma a que o famoso Il Marchesino, como era chamado o cantor, fizesse sombra a Luísa Todi numa Ópera do próprio Sarti.

Marchesi



No entanto, o que Sarti conseguiu foi uma récita extraordinária e tanto Catarina, como toda a Corte, acabaram por ficar deslumbrados com os dois cantores e até com o próprio compositor.

A partir daí Sarti deixou Luísa em paz, contudo os problemas desta continuaram!

Apesar de ganhar fortunas na Rússia, o marido de Luísa perdia todo o dinheiro ao jogo e a Luísa não restava outra solução, senão pedir cada vez mais e mais dinheiro a Catarina.

Como é natural, Catarina II acabou por pôr termo à situação e Luísa Todi e seu marido partem rumo à Alemanha e a França.

Em Bona é homenageada com uma actuação pelo jovem pianista Ludwig van Beethoven e após uma temporada em Paris e novas actuações na Alemanha instala-se em Veneza, com um contrato no Teatro San Samuele.

Teatro San Samuele em Veneza



Logo na sua primeira récita começa por deixar boquiaberta a assistência ao apresentar-se em palco com as jóias, colar e tiara que lhe haviam sido oferecidos por Catarina da Rússia, mas mais surpreendidos ficaram todos os presentes, assim que começou a cantar, fazendo de imediato com que público e a crítica se rendessem completamente à sua voz, de tal modo que a temporada lírica italiana de 1790-1791 ficou conhecida como "o Ano da Todi".

Durante essa estadia em Veneza, a saúde dos seus olhos deteriora-se gravemente, vendo-se obrigada a interromper as actuações para enorme consternação do público.

Em sua homenagem, foram feitos centenas de poemas, gravaram-se efígies da cantora, tendo havido reacções populares que tocaram as raias do histerismo colectivo.

No seu regresso ao teatro, são os próprios admiradores que o decoram e iluminam, e ao entrar em cena tem todo o público de pé, emocionado, num aplauso que parecia não mais acabar.

Para essa récita, houve tanta gente a querer ouvir Luísa, que o Teatro teve de ficar de portas abertas para que pudesse ser ouvida no largo fronteiro e nas ruas laterais, onde foi escutada em religioso silêncio.

Luisa Todi ostentando a tiara e o colar oferecidos por Catarina II



Actua ainda noutras cidades italianas e em Madrid, até que regressa ao Porto onde actua até aos 50 anos, altura em que o marido morre e ela deixa de cantar, passando a vestir, para sempre, luto carregado.

Seis anos mais tarde, aquando das invasões napoleónicas, Luísa e as filhas, seguindo a restante população do Porto, fogem e, ao mesmo tempo que se dá o desastre da Ponte da Barcas, Luísa cai ao rio, do barco onde estava, levando com ela um saco com todo o seu dinheiro e a maior parte das suas jóias.

Desastre da Ponte das Barcas



A sua criada estende-lhe um remo do barco, Luísa salva-se, mas perde no Douro todos os haveres que transportava. Restam-lhe algumas jóias que ficaram em poder duma filha, entretanto ferida a tiro pelos soldados invasores.

Este ferimento não permitiu que continuassem a fuga e Luísa, as filhas e a criada resolvem entregar-se aos franceses. Mas é o próprio General Soult que, ao vê-la, reconhece-a como a “Cantora da Nação” e toma-a sob a sua própria protecção pessoal.


Pouco tempo depois Luísa parte para Lisboa, onde viverá o resto dos seus dias.

As poucas jóias que lhe sobraram dão-lhe para se instalar numa casa modesta no Bairro Alto e para poder comer.

Esquecida pelo público português, tem de vez em quando visitas dos seus amigos estrangeiros, que gostam de a rever. A pouco e pouco, também esses irão desaparecer.

Aos 60 anos perde a visão de um dos olhos e, 9 anos depois, ficará totalmente cega.

E é assim, só, pobre e na escuridão que esta mulher que já convivera com as personalidades mais importantes do mundo, termina os seus dias. Tem quase 81 anos quando morre em Lisboa, sendo sepultada no cemitério então adjacente à Igreja da Encarnação ao Chiado.

Igreja da Encarnação ao Chiado, Lisboa



Diz-se que terá sido enterrada sem identificação, mas parece que não é bem assim:

Transcrevo agora o que foi dito, a este propósito, pelo biografo da artista, Mário Moreau:

“A zona da igreja onde Luísa Todi foi sepultada deixou, mais tarde, de fazer parte do templo e veio a ser ocupada por uma chapelaria que teve o nº 78 da Rua do Alecrim.

Diversos autores têm escrito que a cantora foi sepultada sem qualquer indicação do local.

Há, porém, razões para supor que tal não corresponda à verdade. De facto, o jornal República publicou um artigo em que se menciona uma afirmação do então dono da referida chapelaria.

Esse senhor, de nome Artur Santos, declarou peremptoriamente ter visto, durante umas obras de levantamento do soalho da loja, a pedra tumular de Luísa Todi. A inscrição estava um pouco sumida, mas não tanto que não permitisse ver nitidamente o nome da cantora.

Foi ainda o referido comerciante quem conseguiu evitar que um dos operários destruisse a pedra com uma picareta. Na época ainda se esboçou a ideia de recuperar a pedra tumular e de dar à grande artista uma sepultura condigna. Mas, como já seria de esperar, nada se fez nesse sentido.

Por nossa parte, entendemos que os fins em vista continuam a justificar amplamente as necessárias pesquisas, por pouco provável que alguém possa considerar o bom êxito do empreendimento e sejam quais forem as objecções que se possam levantar. Em qualquer país que prezasse devidamente os seus maiores vultos já há muito se teria realizado tal tarefa. Na nossa terra, porém, até agora não se conseguiu muito mais do que um sorriso irónico e um encolher de ombros.

Isso não nos impede de renovar aqui a pergunta já feita na República há mais de sessenta e quatro anos: estará a Câmara Municipal de Lisboa interessada na recuperação da pedra tumular de Luísa Todi e em dar à nossa grande artista a sepultura que ela merece?”


terça-feira, maio 27, 2008

Uma vida extraordinária

A propósito da exposição sobre a obra de Le Corbusier que está patente em Lisboa lembrei-me de… Josephine Baker!



Penso que ainda muitos se lembrarão dela!

Uns, como uma artista muito “avançada”para a sua época, outros como uma mulher extravagante e corajosa, outros ainda como uma mulher de escândalos!

Mas o que tem Le Corbusier que ver com La Baker, como os franceses lhe chamavam?

Tem o simples facto de um dia, no já longínquo ano de 1929, no navio que transportava Josephine Baker da América do Sul para a Europa, se ter verificado que em vez de uma Josephine Baker estavam lá duas!!!! Passo a explicar:

Um jovem arquitecto, nascido na Suiça e que na época já tinha o seu estúdio na Rua de Sévres em Paris, sabendo que a artista, que muito admirava, viajava no mesmo navio que ele, resolveu pintar-se de negro e, vestindo apenas de uma tanguinha de penas, quis surpreender a já famosa artista.

A surpresa de se ver representada, numa das suas “vestes” mais famosas, por um jovem e elegante admirador, o mais tarde famoso Le Corbusier, foi tanta que, não só fez com se tornassem amigos, mas também…que viessem a iniciar uma intensa relação amorosa, segundo constam as crónicas da época




Josephine Baker foi mulher de muitos e “badalados” amores e, tal como aconteceu com Le Courbusier, quase sempre ao nível da genialidade.

Alexander Calder, Pablo Picasso, Georges Simenon, E.E. Cummings foram todos eles seus admiradores e em várias fases da sua vida acabaram por se tornar seus amantes.

Este pequeno episódio da viagem transatlântica da cantora e do seu admirador, que recordei a propósito da exposição em Lisboa do grande arquitecto Le Courbusier, acaba por ser afinal um bom pretexto para falar, ainda que de forma resumida dessa figura extraordinária de mulher do Século XX.

Durante a minha infância, o nome dela era-me vagamente familiar, contudo quando no final da década de 60 os jornais noticiaram que Josephine Baker doente e já na casa dos sessenta, fora despejada da sua propriedade em França, e iria voltar aos palcos para poder manter-se a si e às 14 crianças de todas as raças que tinha adoptado, eu comecei a reparar nela e na sua história com mais atenção.




Josephine Baker nasceu em Saint Louis no Missouri (USA), pertencia a uma família de lavadeiras e o seu destino ainda criança foi também o de ser lavadeira… Até ao dia em que uma das “senhoras”, para quem trabalhava, lhe atirou com água a ferver para as mãos, como castigo por Josephine, segundo ela, gastar demasiado sabão.

Um emprego seguinte, de camareira de uma artista de teatro e a posterior substituição de uma corista que adoecera, foi quanto bastou para aos 16 anos chegar à Broadway.

Aí, as suas caretas de olhos vesgos e as suas danças de pernas arqueadas nunca fizeram grande sucesso, mas ao ser escolhida para ir até Paris participar na Revue Negre, a sua sorte mudou!



Em 1925, em Paris, uma negra, de seios nus, vestindo apenas uma tanga de bananas ou de penas, dançando freneticamente e cantando com uma voz forte e diferente das cantoras brancas da época só podia dar em escândalo. Mas foi um escândalo com muito sucesso



Tanto sucesso que passou fronteiras, e era chamada para actuar em toda a Europa e na América do Sul.

Um sucesso que chamava multidões e que, simultaneamente, arrepiava os mais conservadores. Em Viena, numa Igreja próxima do Teatro onde actuou, os sinos tocaram à hora da sua chegada, para que a população não saísse de casa, não se fosse dar o caso de ficar "contaminada" com a sua presença.

Em Paris, um tradicional pai de família americano, não sabendo ao que ía, levou a mulher e a filha a ver o espectáculo de Josephine no Casino de Paris e, ao intervalo, já saía esbaforido, arrastando as duas, conforme conta nas suas memórias a filha, de seu nome Nancy e que depois de casada viria a ter o apelido Reagan.




Para Josephine, no entanto, nada importava o que diziam dela!

Era a mulher de quem se falava sempre, fosse pelos seus espectáculos, fosse pelos seus namorados, fosse pelo seu leopardo domesticado (Chiquita) que gostava de trazer por uma trela nas ruas de Paris e que ela até gostava de levar ao teatro.

Entretanto Josephine, sempre irreverente mas muito lúcida, havia tomado uma decisão, ainda jovem: Só voltar a actuar no seu País natal quando os Teatros fossem racialmente integrados.

E, quando, após ter feito uma reclamação pública por lhe ter sido recusada a entrada no famoso Stork Club de Nova Iorque, foi acusada de comunista e colocada na lista negra, tomou também a decisão de se colocar activamente ao lado dos movimentos pelas liberdades cívicas.

Foi por isso, que se viu Josephine Baker discursando ao lado de Martin Luter King, aquando da manifestação sobre Washington e foi igualmente por essa razão que a viúva de King se deslocou à Europa, em nome do seu movimento, para pedir a Josephine Baker que assumisse a respectiva liderança.

Já doente e a enfrentar graves problemas financeiros, Josephine não pode aceitar o convite, mas a verdade é que ela já tinha feito imenso pela causa da liberdade ao ser membro activo da resistência francesa, na ajuda a fuga de muitos políticos franceses para Argel e no papel de informante dos Aliados, quer nas chancelarias de Paris, quer em vários pontos da Europa.

A sua actividade de resistente anti-nazi, viria a ser reconhecida pelo Governo Francês com as mais altas condecorações do Estado gaulês, assim como pelos restantes Governos Aliados que através dela tiveram acesso a informações preciosas que ía colhendo junto das elites dos países do Eixo, a quem facilmente tinha acesso nos países neutrais por onde passava.



Ajudada pela sua amiga Grace do Mónaco que lhe ofereceu uma Villa, Josephine teve no entanto de continuar a actuar para poder manter o apoio às crianças que tinha tomado a seu encargo, tendo no final dos anos 60 e principio dos anos 70 iniciado uma parceria com Chico Buarque de Holanda, com quem deu inúmeros espectáculos conjuntos na Europa e no Brasil.

Foi na noite anterior, ao último espectáculo de uma temporada que realizou em Paris, que a criadora de J’ai deux amours morreu de um ataque cardíaco em 1975. Tinha 69 anos!

Para Josephine, nem tudo foram rosas, sendo o seu percurso repleto de altos e baixos, mas na verdade teve uma vida extraordinária e penso que ao aproximar-se mais um aniversário do seu nascimento, o que acontecerá no próximo dia 3 de Junho, é mais do que justo deixar aqui um breve registo da sua memória.

sábado, maio 24, 2008

Franz Schubert, Amália Rodrigues, Suzy Paula e.... Eurovisão

Franz Schubert, Amália Rodrigues e Suzy Paula... o que têm em comum?

Bom, aparentemente nada, a não ser que há um nome que faz a ponte entre todos eles!

E esse nome é o da holandesa Lenny Kuhr, nome que certamente não é estranho aos portugueses da minha geração.



Trata-se de uma cantora com uma voz magnifica e que tem um percurso artístico muito interessante.

Lenny Kuhr, que em 1969, era uma muito jovem cantora com 19 anos de idade e apenas dois anos de carreira, ganhou nesse ano o Festival da Eurovisão, ex-equo com outros três concorrentes, interpretando a canção De Troubadour.

Desde aí, Portugal tem estado de algum modo alheio a esta cantora, mas o mais curioso é que ela não se tem alheado de Portugal. Já veremos porquê! Para já façamos um breve percurso pela sua carreira.

A canção que levou à Eurovisão, da sua autoria, fugia completamente ao conceito de canção festivaleira, tendo apesar disso, ou por isso mesmo, um enorme sucesso da crítica e do público!

Julgo que vale sempre a pena revisitá-la pois é uma melodia que não consegue ficar datada. Vê-la-emos aqui na sua apresentação de consagração como vencedora do Festival.


O que se seguiu para Lenny Khur, foi uma carreira internacional, tendo como base Paris. Nessa cidade, durante os anos 70, associou-se ao grande cantor francês Georges Brassens, fazendo durante anos espectáculos conjuntos.

Posteriormente, a sua vida pessoal levou-a ao casamento, à conversão ao Judeísmo e a uma ida para Israel, onde viveu vários anos da década de 80.

A sua carreira entretanto foi-se consolidando, tendo-se tornado num dos nomes mais prestigiados da Holanda, quer através de bem sucedidas interpretações das canções de Franz Schubert, que ficaram belíssimas na sua voz.



Quer através de colaborações com com o guitarrista Freek Dicke.

Num dos seus melhores trabalhos, feito em colaboração com aquele instrumentista, chamado Heilig Vuur, Lenny Kuhr resolve deixar libertar a sua paixão por um género musical que muito admira, o Fado.

Admiradora de Amália Rodrigues, compõe a canção Ik Zal Altijd Om Je Blijven Geven (Dar-te-ei sempre), onde a influência do fado se encontra muito presente.




Mas a sua admiração ao fado não se ficaria por aqui, a pouco e pouco ele irá fazer parte integrante do seu repertório!

Primeiro incorpora nele e grava uma versão em holandês do “Fadinho da Ti Maria Benta” de Amália.

Mais tarde, assumindo a sua paixão por este género musical, grava um disco com o nome de FADISTA, em que presta uma bela homenagem à “canção nacional” portuguesa.

Nesse trabalho, além de canções originais, onde a melancolia e a saudade são temas de referência e onde as sonoridades fadistas estão sempre presentes, Lenny Kuhr interpreta, na sua lingua natal, dois fados de Amália, sendo um deles “Solidão” de Frederico de Brito, Ferrer Trindade e David Mourão Ferreira.



Sendo autora de belíssimas melodias e de versos inspirados, os seus maiores sucessos contudo, teve-os inesperadamente em canções completamente fora do percurso normal da sua carreira.

Em 1972, em França, esteve várias semanas no 1º lugar das tabelas de vendas com a versão gaulesa da canção de Roberto Carlos “Jesus Cristo”.

E na Holanda, no inicio da década de 80, tornou-se praticamente um símbolo nacional, com direito a reconhecimento governamental, por causa de uma canção infantil que compôs e interpretou com um conjunto francês de crianças chamado Poppys.

Esta canção viria também, entre nós, a ser muito popular junto do publico mais pequeno, após ter sido gravada em português por….. Suzy Paula.



Lenny Kuhr encontra-se actualmente a celebrar os seus 40 anos de carreira, dando frequentes espectáculos pelos Países Baixos, nos quais já se tornou inevitável a apresentação de “Uma Casa Portuguesa”, o outro fado do seu disco “Fadista”.


Hoje, que é dia de mais um Festival da Eurovisão, parece ser justo trazer à memória dos visitantes deste espaço, esta cantora de facetas tão diversas e com uma sensibilidade tão próxima da dos portugueses.

quinta-feira, maio 22, 2008

EUROVERSÕES

Hoje venho encher o blog de música.

Estamos a poucos dias de mais um Festival da Eurovisão.

Durante muitos anos vivi com muito interesse tudo o que dizia respeito a este concurso de canções. Acompanhava pela rádio, tv e jornais os sucessos e peripécias dos nossos artistas, deleitava-me a ouvir todas as canções concorrentes e acabava invariavelmente com uma angustiazita por a canção portuguesa não ficar com uma classificação de jeito.

Entretanto o Festival já não é o que era e…. eu também não!!!! Mas as memórias desse tempo ainda perduram.

Nessa altura interrogava-me sobre a razão das nossas más classificações. Para tentar encontrar a razão, procurava colocar-me no lugar dos espectadores e dos jurados estrangeiros e a melhor forma de o fazer era ouvir as versões das canções portuguesas que eram distribuídas pela Europa fora!!!

Todos sabemos, que políticas das editoras e mesmo outras “políticas” tiveram influência nos resultados das canções portuguesas. Contudo, depois de ouvir, estas que trago aqui hoje e muitas outras que deixei no baú, acabo por perceber porque nunca fomos muito longe!

Comecemos pelos anos 60, época em que enquanto os outros países nos punham à margem, os nuestros hermanos eram sempre compreensivos e lá deixavam cair uns pontinhos! Talvez por afinidade política, talvez por serem nossos vizinhos, ou talvez porque as versões em castelhano saíram benzinho e cumpriam os objectivos:

Tanto no grupo das alegres





Como no das "dramáticas"



Chegados aos anos 70 percebi que algumas das nossas canções, por muito que apostemos nelas, o melhor é manterem-se apenas na nossa língua:



Nas que nos chegaram a partir dos anos 80, passou-se a apostar mais nos modelos “prontos a ouvir” e nessa medida a coisa lá foi cumprindo o objectivo, sem grandes proveitos, mas pelo menos com dignidade:



Por essa altura, consolidou-se a ideia de que cantar em inglês seria um passaporte para o sucesso internacional, mas a verdade é que as coisas não são automaticamente assim e é sempre conveniente não cair na rima fácil e banal:



Ou cair mesmo em versos de alguma infantilidade:




Chegou-se ainda a tentar até ir até mercados diferentes, fazendo versões em linguas menos familiares aos nossos hábitos, como neste caso em holandês:




Ou neste, em alemão, onde aliás se prova que uma boa canção não precisa de bailarinas e efeitos especiais e que em qualquer lingua se mantém bela:



E por hoje, depois destas memórias soltas postas sob a forma de blog, acho que já cumpri o que prometi e enchi-o de música… mas falta-me ainda a canção portuguesa deste ano… em inglês. Vai já a seguir... com a certeza de que o compositor da canção já está a fazer história neste certame.

O compositor da canção portuguesa é o croata Andrej Babic que foi o autor da canção da Croácia em 2003, da canção Bosnia-Herzegovina em 2005 e da canção da Eslovénia em 2007. Vamos lá a ver se à quarta é de vez...

segunda-feira, maio 19, 2008

Muralha

É um nome conhecido e respeitado em todo o Brasil. E não só!!!!

Vive em São Paulo e é uma das romancistas e dramaturgas de maior sucesso, tanto junto da critica literária e teatral, como junto do público.

Escreveu e já viu levadas à cena 20 peças de Teatro.
Publicou 5 romances e uma biografia.

Traduziu, entre outras, obras de Samuel Becket, Jean-Paul Sartre, Ingmar Bergman, Edward Albee, Peter Shafer.

É autora de séries, mini-series e novelas para a Televisão, como Os Maias, A Muralha, A Casa das Sete Mulheres.

Por 21 vezes recebeu prémios de melhor obra.

Tem 65 anos e… é portuguesa!

Chama-se Maria Adelaide Amaral, nasceu em Valongo e encontra-se no Brasil desde os 12 anos.



Quem teve a felicidade de assistir em Lisboa, no final de 2006, à peça Mademoiselle Channel, brilhantemente interpretada pela Marília Pêra sabe bem da qualidade extraordinária desta autora.



Aliás, esta peça, que representada em Paris na Cómedie des Champs Elysées, pela mesma actriz, deixou espantados críticos e público parisiense pela qualidade e reconhecimento histórico do texto, entusiasmou de tal forma a própria Casa Channel e Karl Lagarfeld, que fizeram questão de ceder à produção do espectáculo 9 modelos originais para serem usados em todas as récitas.



Quem viu na televisão séries como a “A Muralha” ou “A Casa das Sete Mulheres”, sabe bem da riqueza e intensidade dramática das suas obras.

Quem viu a inteligência, o rigor e o sentido dramático das adaptações de “Os Maias” para a Globo ou do “Evangelho Segundo Jesus Cristo” para os palcos, percebe bem a razão de ser de tantos prémios que foram atribuídos a esta nortenha radicada em São Paulo.



Quando no inicio dos anos 90 foi condecorada pelo Estado Português numa cerimónia solene que decorreu num jantar oficial no Convento do Beato, perante a nata política e intelectual nacional, Adelaide Amaral, ao usar da palavra disse que, embora agradecesse a condecoração recebida, a maior homenagem que poderia ter da sua pátria seria ver aqui representadas as suas peças.
Até hoje as suas palavras tiveram pouco eco.




Quando em comentário ao meu anterior post um dos visitantes referiu que o Teatro Nacional não prestigia suficientemente os autores portugueses, lembrei-me desta cerimónia e das palavras de Maria Adelaide.

Tirando Maria do Céu Guerra que em 1993 levou à cena a peça “De Braços Abertos” e a Seiva Trupe no Porto que encenou “Para tão longo Amor”, creio bem que mais nenhuma das peças desta autora foram representadas em Portugal, por portugueses.

Num país onde a qualidade e quantidade de dramaturgia é tão reduzida, talvez não fosse má ideia, que as nossas principais companhias se lembrassem, com alguma frequência, desta nossa compatriota de Valongo, dando a conhecer ao nosso público as suas obras, não apenas porque se trata de uma escritora portuguesa, mas porque as suas obras têm qualidade!

Espero, sinceramente, que não exista uma qualquer “Muralha”, de qualquer natureza, a impedir a, mais que necessária, divulgação de obras de uma portuguesa em Portugal.

sábado, maio 17, 2008

Um Conto Americano - no D. Maria II

Encontra-se em cena no Teatro D. Maria II a peça de David Mamet, The Water Engine, que aqui é designada por Um Conto Americano.

Fui vê-la no passado sábado!



Trata-se de uma peça originalmente escrita para a rádio e que portanto necessita de adaptações, obrigando o encenador a uma série de opções difíceis.

Difíceis não só por isso, mas também porque a linguagem de David Mamet é, no texto original, toda ela simbólica, feita de pequenas frases, quando não monossílabos, fazendo-as assemelhar-se a um percurso difícil, que reflecte acima de tudo os elementos caracterizadores da personagem.




As falas do protagonista no texto original, como assinalou o New York Times, a propósito de uma encenação efectuada em 1999, seriam no mundo real frases próprias de alguém que sofreu uma lobotomia ou que se encontra hipnotizado. No mundo de Mamet, porém, serão frases de pureza e ingenuidade, num mundo adulto e obcecado por interesses mesquinhos e jogos sujos de poder.

Apesar de toda esta complexidade, a peça tem passado por vários teatros de todo o mundo e dado origem às mais diferenciadas concepções cénicas.




Numa das suas duas últimas produções, a de Minneapolis (Dezembro de 2007), o minimalismo da encenação foi levado ao extremo, limitando-se a reproduzir em palco uma emissão radiodifundida da peça.

A solução do encenador foi, simplesmente, a de colocar microfones espalhados pelo palco e pôr os actores a ler a peça e deitando em seguida, para o chão as páginas de texto já lidas.

Em Boston (Outubro de 2007), uma outra encenação desta peça, teve igualmente um início “radiofónico”, "saltando" depois as personagens do estúdio de rádio para um ambiente mais realista. Em ambos os casos a peça não durava mais de hora e meia.

E em Lisboa? Bom aqui a peça teve uma encenção bastante complexa que a faz durar cerca de duas horas e meia!!!

E esse excesso, imaginado como um dos seus trunfos, é afinal um dos seus principais problemas! Mas já lá irei!



Em Lisboa, o espectáculo tem tudo menos de minimalista. Trata-se de um espectáculo que revela um empenho muito forte de toda uma equipa e em que o cenário acaba por assumir o lugar mais importante da peça!

Penso que a opção da encenadora portuguesa foi não poupar meios, nem actores. Foi dar-nos uma visão o mais alargada possível de todas as mensagens que Mamet quis transmitir, dar-nos todas as palavras, todos os gestos, todos os sons, dar-nos o principal fio condutor e todos os fios paralelos e afluentes. Foi dar-nos um espectáculo grandioso.

Agora, se me perguntarem se eu acho que do enorme esforço da encenadora e dos actores, que de todo o empenho nos pormenores, que de toda a imponência e perfeição do cenário, que de toda a complexidade cénica resultou um espectáculo agradável, entusiasmante e apelativo terei que dizer, na minha modesta opinião que, infelizmente, não!

As razões desta minha desconsolada visão da peça, sintetizarei mais adiante, refiro agora, apenas, que no final da récita a que assisti, a frieza e escassez de aplausos da plateia, revelavam que não era apenas eu que iria sair do teatro frustrado.



Para já abordemos o tema da peça! Trata-se de um tema muito aliciante.

Em 1934, ano da Exposição Universal de Chicago, um jovem inventor desta cidade, descobre um meio de usar o hidrogénio da água, para fazer trabalhar um motor.

Querendo patenteá-lo, acaba por ser impedido pelo verdadeiro poder que domina a cidade e o mundo: o poder económico.

Partindo daqui desenvolve-se a acção que abrange um conjunto variado de personagens.

O inventor, a sua irmã, os seus amigos, os advogados, o jornalista, as “bailarinas”, os “políticos”, os operários e o povo em geral.

Chegados aqui, após esta longuíssima introdução, gostaria de dizer o que achei bem na peça e o que não gostei:

Pontos positivos:



- A qualidade visual do espectáculo e todo o funcionamento do cenário.
Logo de inicio é-nos dada uma visão do mundo, muito à semelhança das imagens de Metropolis de Lang, com uma movimentação de actores e figurantes encadeada num cenário industrial, que ele próprio, tal como em no filme de Lang é a razão de ser da vida daquela sociedade.
Esteticamente o cenário e a movimentação de actores, do principio ao fim, é de grande beleza, como raramente se vê em palcos nacionais.

- A atenção a quase todos os detalhes físicos dos elementos de cena, seja o guarda-roupa, sejam os adereços (excepto os planos da máquina, que são absolutamente risíveis).

- O cuidado na justeza dos suportes musicais, com canções de época perfeitamente enquadradas no espectáculo.

Aspectos negativos:



- Referenciações de época algo confusas.
Na verdade, pelo meio da acção principal, ocorriam quadros paralelos, que nos remetiam para algo, que deduzo serem evoluções político-sociais que aconteciam mundo fora, nomeadamente a ascensão do nazismo e do fascismo! Mas, será que era isso? Nem eu, nem as restantes pessoas que comigo assistiram ao espectáculo, ficaram com uma ideia clara do que se passou!

-Lentidão na acção.
Uma peça com um texto que nos conduz a uma meta-realidade e em que as personagens são mais arquétipos do que gente comum, fica excessivamente cansativa se recheada de elementos de dispersão, por muito interessantes e cuidados que sejam.
Antes do intervalo já se via uma ou outra pessoa a dormir e no final do espectáculo o cansaço parecia já ser generalizado.

-Desequilíbrio nas interpretações.
Esta é um velho problema do nosso Teatro, que aqui mais uma vez aconteceu. Não só não se viu nenhuma interpretação excepcional, como algumas foram mesmo bastante más!
Estiveram bem Luis Gaspar ( Lang, o protagonista), Rui Quintas, Mário Jacques, Paula Mora e Maria Emília Correia (que também encenou o espectáculo).

Estiveram mal Paula Neves (a irmã cega de Lang) e Mané Ribeiro (secretária da personagem desempenhada por Rui Quintas).

Infelizmente ambas as actrizes estiveram em permanente over-acting, gritando o tempo todo. No caso de Paula Neves, penso que sobretudo por dificuldades na colocação da voz. O certo é que, no que se refere a estas duas deficientes representações, aquilo que se pretendia como paradigmas de um dado tipo de pessoa, acabou por transformar em verdadeiras caricaturas, desajustadas do contexto e da ambiência da peça.

Refiro ainda o caso do excelente actor Manuel Coelho, que fez o melhor que pôde no papel de um “inventor” à procura de uma entrevista, mas que viu os seus esforços completamente inutilizados por uma encenação que nesse ponto foi bastante infeliz e por contra-cenas de Mané Ribeiro tão forçadas, que pareciam quase de amadora.



Finalmente, do saldo dos pontos positivos e negativos, vem uma sensação de algum tédio, de uma desagradável frustração e de estarmos perante uma aposta importante do D. Maria II, que terá ficado aquém do desejável.

Saí-se do D. Maria II com a noção de que sob a aparência de um espectáculo, estivemos a observar um longo exercício intelectual, umas vezes interessante, outras vezes confuso, em que o que mais se destaca são alguns aspectos cénicos perfeitamente notáveis.

Não me arrependo de o ter ido ver, mas não posso deixar de colocar algumas reservas se me perguntarem se valerá a pena a deslocação!

quarta-feira, maio 14, 2008

Mirene e Marina

Depois de há uns dias atrás ter trazido ao blog algumas canções da Madalena Iglésias, resolvi hoje falar um pouco de duas cançonetistas que deixaram há muito de se ouvir…

E lembrei-me delas porquê? Porque ontem a RTP1 estreou ontem uma rubrica no final do Telejornal, em que abordou a problemática do cancro da mama, tendo entrevistado algumas figuras públicas que tiveram este problema.

Entrevistaram Simone de Oliveira, tendo posto uma canção sua, como música de fundo. Chamava-se essa canção Fúria de Viver.

Entrevistaram também Tonicha e fizeram o mesmo, colocaram como fundo musical uma canção criada por Tonicha, chamada Fui ter com a Madrugada, contudo a voz não era a de Tonicha… Essa voz era de Mirene Cardinalli.



Tratava-se de uma canção que valeu a Tonicha o 2º lugar no Festival da Canção de 1968, a escassos 2 pontos de Verão de Carlos Mendes.

Penso que terá sido uma gaffe da edição do programa, repetindo o erro que aliás já vi há algum tempo em alguns blogs.

Bom, o certo é que com isto a voz de Mirene voltou felizmente a ouvir-se na televisão portuguesa.

E ao lembrar-me de Mirene, recordei igualmente Marina Neves.

Ambas morreram muito jovens e ambas, curiosamente, tinham um estilo e um timbre muito semelhante, que na altura, alguns críticos consideravam pouco original, dado que ambas se assemelhavam, talvez em demasia, a Simone de Oliveira, que na época era a voz feminina mais conceituada



Mirene Cardinalli (da família dos proprietários do Circo Cardinalli) nunca negou as semelhanças com a criadora da Desfolhada, mas recordava ter começado a cantar muito jovem, ainda antes de Simone, e de ter tido sempre o mesmo estilo.

Fez parte da sua carreira em Angola, para onde havia partido no início dos anos 60 e onde teve enorme sucesso. Quando regressou, em 1967, conseguiu rapidamente impor-se na “Metrópole”, sendo as suas canções: Mal de Amor, Julgamento, Livro Sem Ter Fim, Adeus ao Verão e Canção do Novo Sol, repetidas diariamente nas rádios.

Esta notoriedade permitiu-lhe participar no ano seguinte, a par de Tonicha e Simone, no Festival RTP com a canção Vento Não Vou Contigo.




Infelizmente a sua carreira não durou muito mais, no dia 19 de Dezembro de 1969, a caminho de Évora, um acidente trágico tirou a vida a Mirene Cardinalli e a outros colegas que a acompanhavam (salvou-se apenas, apesar de ter ficado muito ferida, Maria de Lourdes Resende). Mirene tinha 27 anos.

A carreira de Marina Neves ainda foi mais curta.

Tendo-se iniciado no Centro de Preparação dos Artistas da Rádio, no inicio dos anos 60, tornou-se particularmente notada, quando a editora Alvorada, resolveu em 1964 editar as canções do Festival desse ano, por vozes diferentes das dos criadores.

Marina Neves foi escolhida para cantar Olhos nos Olhos, e fê-lo numa colagem tão precisa à versão original de Simone de Oliveira, que foi com um misto de surpresa e de crítica que foi recebida a sua interpretação. A polémica daí resultante foi quanto bastou para que se tornasse de imediato uma cantora requisitada.




Marina Neves, jovem muito bonita e bastante simpática, tornou-se figura indispensável dos Serões para Trabalhadores , tendo feito sucesso nesses e em todos os outros espectáculos em que participou.

A sua voz e expressividade em palco tinha potencialidades que infelizmente não pode desenvolver.

Uma doença oncológica, poucos meses depois, afastá-la-ía dos palcos e tirar-lhe-ia a vida.

As canções que deixou gravadas testemunham a sua qualidade vocal, apesar de, no entanto, estarem muito aquém do que ela merecia. A sua morte, prematura, com pouco mais de 20 anos provocou na altura, uma verdadeira comoção nacional.

Tal como sempre acontece, tão forte foi a comoção, quão rápido foi o esquecimento.

Mas tudo isto veio a propósito de uma canção de Tonicha e de uma gaffe (espero não estar a ser injusto) da RTP.



Terminemos pois com esta canção quer originou estas minhas recordações. É do Festival de 1968 e nela teremos Tonicha vestida com um fato curiosamente parecido com o que Cliff Richards usaria poucas semanas depois no Festival da Eurovisão:

segunda-feira, maio 12, 2008

Lorna, a mãe e a irmã

É conhecida como a “outra” filha de Judy Garland.



Ser filha de quem é e irmã de Liza Minnelli significa carregar consigo sombras demasiado pesadas para conseguir sair delas com facilidade e ganhar o Sol.

Essa dificuldade acresce quando quer no cinema, quer no teatro, quer na televisão nunca teve a sorte de obter grandes papéis, ou as produções em que entrou não terem tido a notoriedade desejada.

Falo, de Lorna Luft, de 56 anos, que depois de 40 anos de uma carreira de centenas de concertos, dezenas de filmes e séries e de inúmeras participações em musicais, lança agora o seu primeiro grande trabalho discográfico




Lorna, que reparte o seu tempo entre Londres e Los Angeles, tem colaborado nos últimos anos com o jovem cantor Rufus Wainwright, na apresentação do seu espectáculo Rufus does Judy live…, um show exclusivamente dedicado às canções de Judy Garland,



Ao mesmo tempo que ela própria, desde 2003 vem apresentando espectáculo de teor idêntico, chamado “Songs my mother taught me”

Depois de ter produzido documentários sobre a vida da mãe, de ter escrito um livro de memórias sobre as suas vivências com Judy e de ter produzido um filme baseado nesse livro, sai agora o seu primeiro CD a solo baseado no espectáculo que tem vindo a apresentar nos últimos anos.

Se Judy é um filão para tantos, por que não o poderia ser para a sua própria filha?



Trata-se de um CD corajoso, onde Lorna, com uma voz já a demonstrar alguns sinais de desgaste, parece apostar tudo!

Neste trabalho, onde até mesmo os arranjos orquestrais são idênticos aos que a mãe utilizou nas suas apresentações a comparação é inevitável. Aliás sê-la-ia sempre!

E esse é talvez, desde o começo da sua carreira, o maior problema de Lorna.

O que faltou pois a Lorna, para ter a notoriedade da mãe e da irmã? Não é capacidade vocal! Pois revelou-a logo aos 11 anos num programa televisivo especial de Natal, na presença da mãe e da irmã.



Nem domínio de palco, como se pode ver já adulta, no início dos anos 80, cantando I've Got Rhythm



O que lhe faltou e penso que falta, é algo que só muito poucos possuem. Uma magia e um magnetismo que está para além do muito bom.

Sinto pena que Lorna possa não ter tido os papéis apropriados e as canções adequadas para poder demonstrar essa capacidade. Ou, se calhar teve a oportunidade, mas faltou-lhe a centelha que transforma uma música ou uma representação num momento de magia como sua mãe Judy e a sua irmã Liza bem demonstraram!

Trago aqui, o que para mim, constituem dois exemplos de genialidade, quer de Judy, quer de Liza:

Judy, estava a preparar o seu show televisivo, quando foi assassinado o seu grande amigo pessoal, John Kennedy.

Emocionalmente abalada pediu à NBC para cancelar a transmissão, o que aquela emissora não aceitou, tendo exigido que se cumprisse o contrato, como previsto.

Judy propôs então incluir no programa algo que até aí não era habitual no seu repertório, um hino patriótico, do tempo da Guerra Civil, chamado The Battle Hymn of the Republic, em homenagem ao Presidente assassinado.

Os produtores contrariados, pois não lhes agradava a ideia de uma homenagem política com hino com mais de 100 anos, num espectáculo de variedades para a família, acabaram por concordar e a emotiva interpretação de Judy, poucos dias após o assassinato do seu amigo, ficou para a história da televisão.

Com tal impacto, diga-se aliás, que viria, passado um ano, ser repetida em Londres nos funerais de estado de Winston Churchill e utilizada, como homenagem musical no funeral da própria Judy Garland, 5 anos depois.



Quanto a Liza, repare-se nesta interpretação “especial” de New York, New York, ao vivo aquando do espectáculo comemorativo dos 100 anos da Estátua da Liberdade 1986), em que ao tradicional final da canção, Liza acrescenta um novo final, subindo ainda mais na escala musical.

A melhor gravação sonora desta “versão especial” pode ser encontrada (em cd e vinil) do espectáculo de 1987 no Carnegie Hall, havendo registo desta versão "especial" no espectáculo realizado em Paris com Aznavour em 1992 (cd e Dvd).



Ora, perante estes dois exemplos, o que pode fazer Lorna para que desta família venham ainda mais surpresas? É esse o seu problema!

Lorna, sendo eventualmente melhor do que a maioria das cantoras da sua geração, tem contra si uma expectativa permanentemente alta, esperando-se dela o milagre de superar o insuperável.

Um milagre que até hoje ainda não conseguiu e que, apesar de todo o seu esforço, todo o seu talento, dificilmente aos 56 anos irá conseguir!

Po fim, deixo aqui uma das faixas deste seu CD, que eu há muito esperava, mas que, sinceramente, agora, poderá não a conseguir fazer recuperar o tempo perdido.



quinta-feira, maio 08, 2008

Dalida



No passado sábado completaram-se 21 anos sobre a morte de Dalida (1933-1987)

Poucas personalidades do mundo artístico nos anos 60, 70 e 80 provocaram tanta emoção ao público, como aconteceu com esta cantora.

Mais de 30 biografias, já foram publicadas sobre ela e a sua vida já deu origem a obras de ficção escrita, canções e filmes.

Talvez mais do que por ser uma personalidade artística incomum, toda esta atenção se deva ao facto de ter tido uma vida tão gloriosa quanto romanticamente trágica.

De ascendência italiana, de seu nome Yolanda Gigliotti, nasceu no Egipto, onde viria a tornar-se tornar-se rainha de beleza.

Com o título de Miss Egipto na bagagem, parte para Paris em 1955, onde de imediato inicia uma carreira artística que será de sucesso ininterrupto.






Contudo, a sua vida privada foi um mar de problemas e de sofrimento, sempre sob os olhares ávidos do público.

Tendo-se ligado muito jovem ao director de rádio Lucien Morisse, veio a divorciar-se ao fim de 5 anos de vida em comum.

Lucien Morisse viria a suicidar-se poucos anos depois, no que foi um dos sucessivos acontecimentos trágicos que marcariam a sua vida.

Dalida, entretanto, passados dois anos do seu divórcio, viria a apaixonar-se pelo talentoso, mas perturbado, cantor italiano Luigi Tenco.

Depois de muitos esforços, Dalida convence-o a entrar no certame musical mais famoso de Itália, o Festival de San Remo.





Na noite de 27 de Janeiro de 1967, após a divulgação dos resultados, Tenco não conseguiu aguentar a frustração por a sua canção Ciao Amore, Ciao, não se ter classificado!

Enquanto Dalida e a sua equipe o esperavam num restaurante, ele punha termo à vida no quarto do hotel onde se encontravam hospedados.

Acaba por ser Dalida, poucos minutos depois, a encontrá-lo morto no quarto. Um mês mais tarde será a vez de Dalida tentar o suícidio.

Uma semana depois ao sair do coma, ficou patente, para todos os seus mais próximos, que ela nunca mais viria a ser a mesma pessoa.

Com este acontecimento e com esta canção o público de Dalida veio demonstrar o quanto a admiração por um artista pode ser egoista e até mesmo cruel! Daí em diante, a canção que levou Tenco à morte, tornou-se numa obrigação contratual incontornável para todos os espectáculos de Dalida.

Nessas alturas, o olhar triste e vazio da cantora, e as lágrimas que muitas vezes não conseguia reprimir eram, para o público, o ponto mais alto de todo o espectáculo. O público que adorava a cantora, gostava em simultâneo de assistir ao espectáculo do seu sofrimento.

>


Nos últimos anos de vida, Dalida tentou fugir à solidão em que vivia, tendo encontrado um novo companheiro em Richard Chanfray.

Infelizmente para ela, este seu envolvimento não viria a ser menos problemático que os anteriores, dado que quando se conheceram ele estava a entrar num processo psicológico que o conduziria posteriormente a comportamentos violentos e à loucura.

Após alguns anos de casamento com este homem, que afirmava ter 17.000 anos e ser capaz de transformar metal vulgar em ouro e água em vinho, Dalida conseguiu o divórcio. E poucos meses depois Chanfray viria também a suicidar-se.

Apesar de toda a sucessão de dramas que viveu, Dalida conseguiu sempre manter inalterados o ritmo e o sucesso da sua carreira tanto em França, como no resto da Europa e nos Estados Unidos.

Mas esse sucesso nunca lhe conseguiu dar o suplemento de alma de que necessitava para querer continuar a viver.

Um mês antes de morrer, disse a um amigo, que se ninguém pode escolher o momento em que nasce, ela poderia, no entanto, vir a escolher o momento da sua partida.

E, na verdade, em 3 de Maio de 1987, Dalida, mulher bela, rica, famosa e admirada por milhões de pessoas, recusa-se a continuar prisioneira da solidão e da tristeza que o destino lhe impôs, e suicida-se com uma dose excessiva de barbitúricos.

Deixa um pequeno bilhete, onde estava escrito:“A vida para mim é insuportável… perdoem-me”

A sua voz e as suas capacidades interpretativas, tinham a marca profunda da sua vida conturbada. Com Dalida, a dor transfigurou-se também numa forma de arte, fazendo-nos sentir que alguns dos seus momentos mais terríveis eram, simultaneamente momentos passados para o público de forma artisticamente inesquecível.

A sua interpretação de Je suis Malade no Olympia, em 1981, é disso um exemplo perfeito, pelo que tem de visceralmente emotiva e interpretativamente sublime.



Dalida, pelo seu contributo excepcional para a canção francesa e pela relação de afecto que estabeleceu com a nação gaulesa recebeu, em vida, a mais alta das condecorações do Estado francês e, vinte anos após a sua morte, em recente estudo de opinião, foi considerada a segunda personalidade mais importante do século XX, em França, logo a seguir ao General De Gaulle.

Dalida, está pois bem presente na memória de todos os seus admiradores. O ano passado, ao completarem-se vinte anos da sua morte, França rendeu-lhe um conjunto vasto de homenagens, com a inauguração de estátuas e atribuição do seu nome a ruas e praças. A Câmara Municipal de Paris dedicou-lhe uma exposição recordatória que esteve 5 meses patente ao público…

No entanto, apesar da memória, ficou para além da saudade, um imenso e profundo vazio...

quarta-feira, maio 07, 2008

Stradivarius devolvido a Quint


Reproduzo aqui uma notícia do Expresso, que me pareceu curiosa:


Um violinista norte-americano que se esqueceu do Stradivarius, no valor de quatro milhões de dólares, num táxi nova-iorquino vai dar hoje um concerto gratuito num aeroporto de Nova Iorque, em honra do taxista que lhe restituiu o precioso instrumento.


O músico de origem russa Philippe Quint deixou na semana passada num táxi o seu violino "Ex-Keisewetter", feito em 1723 pelo célebre fabricante e restaurador de instrumentos de cordas italiano Antonio Stradivari ou Stradivarius, como era mais conhecido.

O instrumento ficou no banco de trás do veículo de Mohammed Khalil, que apanhou o violinista no aeroporto de Newark, Nova Jérsia, quando este regressava de Houston, Texas, indicou a representante do músico, Diane Blackman, citada pela AFP.

Philippe Quint, de 34 anos, deu ao motorista cem dólares - "tudo o que então tinha na carteira" - depois de ter recuperado o precioso violino, mas como gesto adicional, propôs-se dar hoje um concerto de meia-hora para os taxistas do aeroporto de Newark.

O violinista convidou ainda Khalil e a família para um concerto que dará no Carnegie Hall, em Nova Iorque, em Setembro próximo.

Deixo aqui a interpretação de Quint da Meditação de Thais de Massenet, num concerto na Cidade do México.