terça-feira, novembro 24, 2009

prisioneiro no próprio corpo



De acordo com notícias publicadas ontem ficámos a saber a terrível história de Ron Houben, um belga de Liege.

O que lhe aconteceu, pode vir a acontecer a qualquer um de nós e certamente vai acontecendo todos os dias por esse mundo fora.

Ron há 23 anos teve um acidente que o deixou em coma e inconsciente, de acordo com os médicos.

Sua mãe contudo, teve sempre dúvidas relativamente ao estado do seu filho e insistiu, procurou segundas, terceiras, décimas opiniões e até que o neurologista Dr Steven Laureys, estudou melhor o seu caso e verificou um erro no diagnóstico.

Ron era um jovem saudável que de acordo, com os médicos teria após o acidente, ficado em estado vegetativo, sem ver, ouvir ou sentir o que quer que fosse.

Contudo os seus pais conheciam-no melhor que ninguém. Transferido do hospital para um lar de assistência a pessoas inválidas, os pequenos sinais que transmitia a seus pais, eram sempre desvalorizados pelos médicos, como meros tiques, típicos do estado em que se encontrava.

Em 1997, quando o seu pai faleceu, a mãe que acreditou sempre que o filho mantinha as suas capacidades cognitivas e que por isso estaria em sofrimento, informou-o da morte do pai. Ele pestanejou, para a mãe isso era um sinal óbvio, para os médicos mais uma vez não foi nada.

Afinal, percebeu-se depois, ao fim de 23 anos, que Ron ouvia, via, tinha o raciocínio intacto, apenas o seu corpo não conseguia dar qualquer manifestação disso.
Estava prisineiro de si mesmo, com a consciência perfeita de tudo o que estava à sua volta.

Só a sua mãe percebia que algo estava mal no diagnóstico oficial! E como disse aos jornais: "Quando se acredita nunca se deve desistir"



Transcrevo a seguir o artigo publicado no "Publico" que resume muito bem este terrível drama humano!

"Em 1983, Rom Houben, então um jovem estudante de engenharia e amante de desportos de combate, sofreu um acidente de viação. O seu coração parou e o seu cérebro ficou privado de oxigenação durante vários minutos. A partir dessa altura o seu corpo ficou paralisado e oficialmente em coma. Mas o diagnóstico dos médicos foi demasiado precipitado. Apesar de completamente imóvel, Rom conseguia ouvir tudo o que lhe diziam. Ouvia os médicos falarem do seu estado de saúde e ouviu a mãe comunicar-lhe a morte do pai. Ouviu tudo isto sem poder chorar nem mexer a cabeça. Estava consciente e com um cérebro a funcionar, mas nunca conseguiu que o seu corpo comunicasse esse facto.

Tudo mudou há cerca de três anos. O neurologista Steven Laureys, da Universidade de Liege, que decidiu experimentar uma nova abordagem aos doentes em coma, libertou-o da sua tortura. Usando um inovador sistema de monitorização da actividade cerebral através de ressonância magnética percebeu que o caso de Rom era o de um falso coma.

O momento em que descobriram que eu não estava num estado vegetativo, disse Houben, foi como se tivesse nascido outra vez. “Nunca esquecerei o dia em que me ‘descobriram’. Foi o meu segundo nascimento”, disse Rom à revista alemã “Der Spiegel”, que trouxe o caso a público.

Nos últimos três anos Rom Houben, agora com 46, foi submetido a intensas sessões de fisioterapia e já conseguiu recuperar algum movimento. Comunica através de um ecrã táctil, acoplado à sua cadeira de rodas.



Rom explicou que, durante todos estes anos, conseguiu suportar o pesadelo de não poder comunicar o seu estado através da meditação e revivendo episódios passados. “Viajei com os meus pensamentos para o passado, ou então para uma nova existência. Eu era apenas a minha consciência, e nada mais”, disse Rom, que fala quatro línguas.

“Impotente. Extremamente impotente. Inicialmente fiquei revoltado, mas depois aprendi a viver com isso”, recorda agora Rom, citado pela AP.

O neurologista Steven Laureys - que chefia o grupo científico que estuda os estados de coma no hospital universitário de Liege - acredita que este caso é apenas um entre muitos, estimando que possa haver inúmeros falsos comas diagnosticados em todo o mundo. Laureys estima que os doentes em coma são mal diagnosticados com “assustadora regularidade”. De entre 44 doentes que se pensava estarem em coma, 18 deles responderam fisicamente a pedidos de comunicação.

De acordo com o “The Guardian”, os médicos belgas que diagnosticaram Rom como estando em coma usaram a escala Glasgow Coma Scale, internacionalmente aceite. Esta escala monitoriza os movimentos dos olhos e as respostas verbais e motoras. Porém, apesar de terem usado esta escala, falharam em determinar o correcto funcionamento do cérebro do doente.

“A partir do momento em que alguém é diagnosticado como inconsciente, é muito difícil arrancar a pessoa a esse estado”, indicou Laureys ao “Der Spiegel”.

O neurologista indicou ainda que todos os doentes classificados num estado de coma não-reversível, deverão ser “testados dez vezes” e que os comas, tal como o sono, têm diferentes fases que precisam de ser monitorizadas.

Houben espera vir a escrever um livro contando a sua experiência e o seu “renascimento”, indica o "The Guardian"."


Assusta pensar que neste mesmo momento inúmeros seres humanos poderão estar a viver drama idêntico! Drama que a qualquer um de nós, ou aos nossos entes queridos, poderá igualmente acontecer.

Face à evolução da Medicina e da Ciência em geral, creio que podemos acreditar em muita coisa, contudo ter uma fé absoluta nas "verdades" científicas é um risco que se vai comprovando ser demasiado grande e com consequências de sofrimento para além do imaginável.

Chegado a esta fase da minha vida, em que por razões pessoais e familiares me tornei frequentador assíduo de consultórios e hospitais, creio que apesar de ser sempre necessário ouvir atentamente as opiniões médicas, temos que estar alerta, usarmos a nossa própria cabeça e, eventualmente, lutar como fez esta mãe, até ao limite da dissipação total das dúvidas que nos possam surgir!

Ao fim e ao cabo nem os médicos são Deuses, nem nenhuma verdade em Medicina é mais absoluta e segura do que a verdade da Morte.

E por isso, até ela acontecer há sempre uma outra possibilidade, por ínfima que seja...

Contudo, a alternativa à morte também não deverá ser o prolongar de um sofrimento sem esperança...

A necessidade de se perceber bem a situação do doente a a luta por um dignóstico seguro e completo deverá ser uma prioridade para todos nós, enquanto indivíduos e enquanto cidadãos.

Economicismos na Área da saúde, são por isso, do mais estúpido e desumano que pode acontecer numa sociedade civilizada!