quinta-feira, setembro 17, 2009

A minha opção

Regressei à poucos dias da Polónia e aproveito para agradecer as mensagens amigas e generosas que entretanto recebi



Ao ter chegado embati naturalmente na campanha eleitoral e portanto na polémica à volta do TGV.

Curiosamente, na Polónia, encontra-se em fase adiantada a construção do TGV e, face aos argumentos que aqui tenho ouvido, sinto-me no meu País a viver dias de absurdo e de pura hipocrisia política.



Mandaria a prudência que o assunto TGV, que naturalmente merece ser discutido, não fosse agora utilizado como arma de campanha política, até porque um dos partidos envolvidos, o PSD, se apresenta nestas eleições com o slogan “Política de verdade”.

O facto é que, das relações internacionais às leis laborais, das medidas sobre a justiça às ambientais, das urbanísticas às da saúde, das agrícolas às de educação, da justiça social aos apoios sociais, há todo um mundo de coisas importantes a discutir que, por causa do TGV, ficaram completamente nas zonas sombrias desta campanha.

E se assim é…. Vou também eu meter a minha modesta colherada neste assunto.

E começo por referir que se relembrei aqui o slogan “Politica de verdade” do PSD foi porque o Governo, em que Manuela Ferreira Leite era a Ministra das Finanças, após ter acordado com o Estado Espanhol a construção de várias linhas de TGV, produziu em 26 de Junho de 2004 uma Resolução do Conselho de Ministros, que merece ser vista agora com toda a atenção.




Essa Resolução que pode aqui ser consultada encontra-se publicada no Diário da República e nela encontram-se previstas 5 linhas de alta velocidade, sendo explicado o seguinte:

A rede ferroviária de alta velocidade assume-se como
um projecto de investimento estruturante que permite
o desenvolvimento de competências empresariais próprias,
assegurando a participação de empresas e indústrias
locais nas diversas fases do projecto incluindo execução
e operação, contribuindo para o crescimento do
produto interno bruto e induzindo a criação de emprego
sustentado, factor decisivo da coesão social do País.”


E na verdade, apesar de a tecnologia sobre a qual assenta o TGV não ser nacional, de acordo com os estudos da altura, e que hoje ainda se mantêm válidos, cerca de 85% do equipamento pode ser produzido pela indústria do nosso país!

Por isso mesmo, a simples construção do TGV, levava o Governo em que Manuela Ferreira Leite era Ministra das Finanças a afirmar que essa obra iria movimentar fortemente o tecido empresarial português, podendo, só por si, elevar anualmente o PIB em mais de 1,7 pontos percentuais, o que resultaria num aumento de receitas fiscais bastante considerável, num efeito catalizador do desenvolvimento do País (até pelo acesso a novas tecnologias) e até numa diminuição de assimetrias regionais!

Isso mesmo encontra aqui desenvolvido nesta notícia da época.

Estranho muito, por isso, que a líder do PSD venha agora dizer que o “TGV é enfeite de novo-rico” e que o “País está endividado e quer uma coisa de que não precisa”.

Afinal quando é que Manuela Ferreira Leite estava a revelar verdadeiramente o seu pensamento sobre a utilidade do TGV?

Antes, quando preparava o argumentário para que Durão Barroso nos garantisse que o TGV era excelente para o País?

Ou agora, como líder do PSD, em que diz que o TGV é uma desgraça desnecessária



A explicação que Manuela Ferreira Leite dá para a sua mudança de opinião, quer sobre a utilidade, quer sobre a oportunidade deste empreendimento, radica, segundo ela, no actual nível de endividamento externo do País, problema que diz resultar da incompetência de Sócrates.

Assim sendo, falemos então, sobre o tal endividamento:

Como todos sabemos a origem do endividamento externo português está no seu tradicional défice comercial: Importamos mais do que exportamos!.

Acresce que, infelizmente, Portugal não é produtor de petróleo, o que torna esse défice crónico e quase inevitável, dado o perfil das nossas exportações.

Mais de metade das importações portuguesas são de combustíveis, e o que o Manuela Ferreira Leite deliberadamente omite é que nos últimos 3 anos anos o preço da parcela mais importante das nossas importações – o petróleo - cresceu 3 vezes!!





Será que MFL nos está a querer convencer que Sócrates poderia alguma vez controlar o preço do petróleo nos mercados internacionais? A dita incompetência afinal só poderia provir daí!

MFL esquece-se ainda de dizer que, apesar desse nível excepcional de crescimento do preço do petróleo, o rácio de endividamento face ao PIB passou de 64% em 2003 para 95% em 2008, o que significa que, apesar de tudo, Portugal conseguiu diminuir o impacto desse aumento de preço no nosso endividamento de 125% para 48%.

Vale a pena referir que as razões desse amortecimento do impacto foram várias, e justiça seja feita, se deveram a políticas internas! Realço duas:

Uma, ainda de importância financeira reduzida, mas extremamente relevante como indicação de caminho futuro traduz-se na aposta nas energias renováveis lançadas pelo Ministério da Economia, que permitiram já reduções nas importações de hidrocarbonetos.

Outra, de maior relevância financeira, foi sem dúvida a pesada e desagradável política fiscal de tributação dos combustíveis, que tiveram um efeito significativo na redução da procura e portanto da factura energética.

Trata-se aliás de uma política tão pesada e tão desagradável que o PSD e o CDS se fartaram de protestar contra ela…

Ora se o Governo tivesse seguido os “conselhos” destes partidos, aliviando a carga fiscal para que o transporte rodoviário se continuasse a fazer ao mesmo nível, o que aconteceria?

Aconteceria que o nosso endividamento estaria não nos 95% de que a Dra. Manuela se queixa, mas dispararia no mínimo para 120% do PIB. E aí sim, o rating financeiro do País desceria às ruas da amargura, com todas as consequências para o custo do dinheiro para os nossos bancos, empresas e famílias!

Bom, mas voltando ao argumento de Manuela Ferreira Leite, será que o actual nível de endividamento face ao PIB é algo de tão aterrador que iniba os investimentos grandes investimentos propostos?

Esquece também aqui a Dra. Manuela que se trata de investimentos faseados no tempo e comparticipados pela União Europeia. Mas parece que para a Dra. Manuela a diluição no tempo ou a concentração temporal dos gastos orçamentais são uma e mesma coisa, e que as comparticipações de muitos milhões são irrelevantes....

Por outro lado, quanto ao efeito nas condições internacionais de crédito, a verdade é que excepto uma agência de rating, a tal, tão credível, que dava à Islândia a sua cotação máxima em vésperas de bancarrota, as duas outras agências de rating não baixaram o ranking do Estado Português, que se situa ainda no nível AA !

E mesmo essa agência, tão considerada pela Dra. Manuela, a S&P, colocou o nosso País, ao mesmo nível da Espanha, Irlanda, Grécia e Itália entre outros países da União!



Acresce ainda que essa indicação de rating que serviu de pretexto a Ferreira Leite para a sua cruzada anti-TGV, se refere a 2008 e que, entretanto, desde Março deste ano, os indicadores de referência, que utilizam como padrão a dívida pública alemã, vêm aproximando os da divida portuguesa aos da dívida germânica, o que significa uma proximidade de Portugal aos parâmetros do padrão mais elevado de confiança.

Manuela Ferreira Leite, deve sabê-lo, mas prefere omiti-lo.

É esta a “Política de verdade”? Ou será que se prepara, caso ganhe as eleições para, poucos meses depois, declarar que o problema do endividamento foi resolvido por ela e que por isso já poderemos voltar a pensar em TGV!

Sinceramente, compreendo a posição de todos aqueles que sempre foram contrários ao TGV por acharem que ele não seria necessário, em termos de expansão ferroviária e de ligações ao centro da Europa. Contudo, no que se refere a Ferreira Leite, fica claro que as suas motivações, pouco têm que ver com convicções ou com a verdade. Têm que ver apenas com um enorme apetite pelo poder…

Quem leu alguns dos posts que aqui coloquei sobre política nacional percebeu claramente que não sou um apoiante de José Sócrates, mas neste caso, concordo em absoluto com ele quando refere que a atitude de Manuela Ferreira Leite é uma atitude retrógrada, uma atitude do passado.

Manuela Ferreira Leite joga sem pudor com alguns factores que crê poderem dar-lhe alguns dividendos políticos.

Em primeiro lugar deve considerar que para além de memória curta, o povo português não tem inteligência.

Em segundo lugar omite dados, manipula conceitos e números crendo que somos todos ignorantes, possivelemente na convicção de que a Economia é seu território exclusivo!

Em terceiro lugar, revelando uma faceta bastante perigosa e irresponsável, utiliza de forma atabalhoada, como factor de mobilização popular, o apelo a sentimentos primários face a imaginários adversários externos.



Neste caso, procurou tirar do baú o sentimento anti-espanhol, como se os eleitores fossem garotos acabados de sair da aula de História onde se aprendeu que Miguel de Vasconcelos foi defenestrado por estar feito com os castelhanos, e que D. Luísa de Gusmão, que por acaso era uma espanhola dos quatro costados, se saiu com a patriótica tirada “Mais vale ser rainha uma hora que duquesa toda a vida” !

Chamar baixa política aos argumentos de Ferreira Leite, que ainda não há muito tempo foi administradora não executiva de um banco espanhol, não é por isso insulto, é o corolário lógico de quem tem alguma memória, algum conhecimento dos factos e tem o mínimo de senso!

Termino lembrando o seguinte:

Apesar dos primeiros projectos para a construção do Metro de Lisboa serem de 1888, apesar de várias linhas na Europa se terem iniciado na transição do século XIX para o século XX e apesar de se ter percebido, desde sempre, a vantagem deste meio de transporte, em termos de qualidade de vida e ordenamento urbano, só em 1959 e depois de 13 outros países da Europa já o terem feito, é que Portugal inaugurou a sua pequena linha de Metropolitano.



Depois de a Alemanha ter sido pioneira na Televisão em 1935 e de o Reino Unido e a França a terem imitado nos anos seguintes, depois de as emissões a cores se terem iniciado em 1954 nos Estados Unidos, Portugal, só em 1957, com um Salazar bastante contrafeito, iniciou emissões televisivas regulares, atrás de quase todos os países europeus e mesmo de vários da América Latina.




Esses foram os tempos em que o Banco de Portugal acumulava barras de ouro e o País era o mais pobre e atrasado da Europa. O Pais onde ainda circulavam carroças nas ruas de Lisboa e a modernidade chegava com décadas de atraso.

Eram os tempos de Salazar cuja fixação, em termos financeiros, era a do equilíbrio orçamental e do défice zero. Ainda que para isso (quase) todos tivessemos que viver numa apagada e vil pobreza…

Manuela Ferreira Leite diz agora que para ela um Estado Moderno é um Estado Rico e que para isso parará o programa de obras públicas que o actual governo propõe….

É uma frase muito infeliz, pouco lúcida, que remete para um modelo passado que julgava não voltar a ver repetido…. Mas que, vindo de quem vem, já não me surpreende, face a tantas afirmações infelizes já proferidas sobre outras matérias…

Sendo realista, analisando o que vejo e oiço, face aos dois únicos possíveis candidatos a Primeiro-Ministro direi, como disse ontem Adriano Moreira que desta vez temos que optar por um mal menor (bom, ele foi um pouco mais duro e disse literalmente que iria votar no menos péssimo…)!

Eu, no próximo dia 27 irei votar PS… A perspectiva de ter Manuela Ferreira Leite como Primeira-Ministra deixa-me verdadeiramente aterrorizado!