terça-feira, setembro 22, 2009

Democracia



O caso da alegada espionagem feita pelo Governo ao Palácio de Belém teve ontem desenvolvimentos e, por força da natureza das coisas, terá decerto, nos próximos dias, novos episódios.... Aliás, para bem da Democracia, é absolutamente essencial que os tenha.

Retomo, pois, o tema através de duas citações:

A primeira de um
texto da TSF, do passado dia 18, prende-se com o que foi publicado no Diário de Notícias, fazendo um resumo muito elucidadivo do assunto (os sublinhados são meus):

"No texto publicado pelo Diário de Notícias afirma-se que a iniciativa para tornar pública a suspeita partiu do próprio chefe de Estado.

É isso que diz Luciano Alvarez, editor do Público, no e-mail que enviou a 23 de Abril de 2008 a Tolentino Nobrega, o correspondente do Jornal na Madeira.

Alvarez informa-o que se reuniu com Fernando Lima, a pedido deste, e que a conversa começou com o assessor de Cavaco Silva a dizer que estava ali a pedido do chefe de Estado para falar de um assunto grave.


E qual era o assunto?


O Presidente da República acha que o gabinete do primeiro-ministro o anda a espiar e que a maior prova disso tinha sido o facto de José Sócrates ter enviado um funcionário do Ministério da Administração Interna à Madeira só para espiar os passos do presidente e dos homens do seu gabinete durante uma visita ao arquipélago.

Luciano Alvarez relata depois que Fernando Lima lhe entregou um dossier sobre Rui Paulo da Silva Figueiredo, o tal elemento do MAI.


O editor do Público explica depois a Tolentino Nobrega porque lhe escreve: «é que para fazer caminho no jornal, a história tem de começar, com todo o cuidado, na Madeira».


Aliás, continua Luciano Alvarez, é também esse o interesse da presidência da República, tal como lhe disse Fernando Lima.

Belém queria que a notícia fosse revelada a partir do arquipélago para não parecer que foi alguém da presidência que soltou a história, mas sim alguém ligado a Alberto João Jardim.

A seguir, Alvarez propõe a Tolentino Nóbrega dois ângulos de investigação que lhe tinham sido sugeridos pelo próprio Fernando Lima.


O editor do Público revela mais adiante que o assessor de Cavaco lhe sugeriu que tratasse com ele desta história por e-mail porque a presidência está com medo das escutas.




Luciano Alvarez sublinha ainda que esta história só é do conhecimento do presidente da República, do Lima, do director do Público e dele próprio.


O e-mail enviado ao correspondente na Madeira termina com um estímulo e «um abraço e vai-te a eles».


Contactado pelo Diário de Notícias, o jornalista do Público, Luciano Alvarez, afirma também que este e-mail nunca existiu.


Já Tolentino de Nóbrega recusou comentar a notícia, alegando que se trata de um assunto interno do jornal.


A TSF procura ainda esclarecimentos junto da presidência da República, mas até agora sem qualquer sucesso."






A segunda citação que aqui trago é a de um texto de Mário Crespo intitulado CRIME PÚBLICO, e que foi publicado ontem no Jornal de Notícias, após Fernando Lima ser demitido por Cavaco, o que configura, na prática, a admissão de que procedimentos graves terão sido cometidos por aquele membro da equipa presidencial:

"Portanto, o Governo está a espiar a Presidência da República!

Gravíssimo!

Que fazer?

Há várias alternativas para um presidente espiado.

Denunciar o Governo espião e dar-lhe um ralhete exemplar em público (nunca no "Público") utilizando uma comunicação nacional na TV como o fez com irrepreensível dramatismo e inigualável teatralidade com o estatuto dos Açores.

Desta vez, teria de incluir a demissão do Parlamento e a convocação de novas eleições. O caso não seria para menos. Um governo a usar serviços secretos do Estado para espiar outro órgão de soberania exige demissões e eleições.

Mas não.

O presidente da República, o mais alto magistrado da nação, o comandante em Chefe das Forças Armadas, sabe que está a ser espiado. Tem a certeza disso porque, da sua doutrina passada ficou o axioma de que "raramente se engana e nunca tem dúvidas". Estando a ser espiado qual é a actuação realmente presidencial para este caso?

Exigir do procurador-geral da República uma investigação imediata?

Convocar o Conselho de Estado (já com a respeitabilidade recuperada desde a saída de Dias Loureiro)?

Fazer uma comunicação ao Parlamento como é seu privilégio e, neste caso, obrigação?

Nada disso!

A Presidência de Cavaco Silva, através da sua Casa Civil, decide encomendar (mandar fazer in: Dicionário Porto Editora) uma reportagem a um jornal de um amigo.

Como os jornalistas são, por vezes, um bocado vagos e de compreensão lenta, a Casa Civil da Presidência da República achou por bem ser específica na encomenda dando um briefing claro a pessoa de confiança no jornal.

"Vais falar com fulano e pergunta-lhe por sicrano, vais aqui, vais ali, fazes isto e aquilo e trazes a demasia de volta".

O homem ainda tentou cumprir com a incumbência, mas a coisa não tinha pés nem cabeça e parece que lhe disseram isso repetidamente.

Por isso, logo, por causa disso, houve mais um ano e meio de fartar espionagem, enquanto no Pátio dos Bichos continuavam todos a ouvir vozes.

Cavaco Silva deve ter tido uma birra monumental com a sua Casa Civil e mandou perguntar ao amigo do jornal: "Sócrates está quase a ser reeleito e essa notícia não sai"?

Como o que tem de ser tem muita força, a história lá saiu. Mal-amanhada, mas era o que se podia arranjar.

Lá se meteu a Madeira no meio porque, como ninguém gosta do Jardim, gera-se logo um capital de boa vontade.

Depois, como tinha pouca substância, puseram na mesma página duas colunas ao lado a dizer que, há uns anos, o procurador-geral da República tinha dito que também estava a ser escutado, e a encomenda ficou mais composta.

Que interessa que tudo isto seja bizarramente inverosímil? Nos média, o que parece, é.

Cavaco Silva julga que está a ser escutado, portanto, está a ser escutado, tanto mais que o seu recente depoimento presidencial é que "não é ingénuo".

Com tudo isto, fica-me uma certeza. O trabalho de reportagem do "Diário de Notícias" é das mais notáveis e consequentes peças jornalísticas na história da Imprensa em Portugal.

O e-mail com registos claros da encomenda feita por Fernando Lima não é "correspondência privada" que se deixe passar pudicamente ao lado. É uma infâmia pública de gravidade nacional que exige denúncia.

Invocar aqui delações, divulgação de fontes ou violação de correspondência é desonesto.

Ao ver o Presidente e a Casa Civil metidos nisto fica-me também uma inquietante dúvida. Aníbal Cavaco Silva, referência do PSD, ainda tem condições para continuar a ser o presidente de Portugal depois de causar uma trapalhada desta magnitude a dias das eleições? "




Penso que a dúvida final levantada por Mário Crespo tem toda a legitimidade e é aí que a Democracia portuguesa tem que se focar de imediato.

Há coisas que são tão graves que não se podem deixar passar em claro!

Há coisas que forçosamente têm de ser esclarecidas.

Não sei que esclarecimentos irá prestar Cavaco Silva, se é que os vai prestar!

Contudo, sejam eles quais forem, o próximo Parlamento tem poderes constitucionais para tratar este assunto, que deverá, pela sua extrema gravidade, ser encarado como prioritário e urgente e ir, sem hesitação, até às últimas consequências!

Se o Parlamento não o fizer, por medo, inacção ou simples calculismo político, compete aos cidadãos fazer todas as pressões ao seu alcance para que ele cumpra o seu dever!

A demissão do assessor!


Cito a primeira parte de um texto do DN on-line de ontem:

"O Presidente da República, Cavaco Silva, afastou hoje Fernando Lima do cargo de responsável pela assessoria para a Comunicação social, que passará a ser desempenhado por José Carlos Vieira.

Segundo disse à Lusa uma fonte oficial da Presidência da República, trata-se de uma "decisão do Presidente da República".

No 'site' da Presidência da República o nome de José Carlos Vieira já se encontra como o assessor para a Comunicação Social.

Na sexta-feira passada, o Diário de Notícias denunciou que o caso das alegadas escutas a Belém tinha sido encomendado por Fernando Lima a um jornalista do jornal Público."


Quando alguém é demitido é porque, quem o demite, considera que foi feito algo de muito errado!

Ora os acontecimentos que deram origem a esta demissão não são de ontem.

Ocorreram à dezoito meses e foram objecto de publicação, no passado mês de Agosto pelo "PÚBLICO" (portanto já em época de pré-campanha eleitoral).

Sobre eles, durante todo este tempo, Cavaco Silva nada fez, senão dizer um conjunto de banalidades que serviram apenas para adensar suspeitas sobre uma hipotética vigilância do Governo à Presidência! Algo que talvez, por mera coincidência, se harmonizava com o discurso de "asfixia democrática" que a lider do PSD vinha utilizando com permanente insistência....

Entretanto, já há várias semanas que o nome de Fernando Lima fora citado por Francisco Louçã, como a "fonte" do PÚBLICO, dado que, segundo parecia, a identidade da "fonte anónima de Belém", era já do conhecimento geral nos mundos da política e da comunicação social!

Como não é plausível que Francisco Louçã conheça melhor do que o Presidente o que se passa no Palácio de Belém, resta-me concluir que Cavaco Silva já sabia há bastante tempo desta história, pelo que, das duas uma:

Ou teria sido o Presidente o verdadeiro instigador da passagem de informações ao "Público", tal como parece retirar-se das notícias publicadas pelo DN, pelo que a demissão do assessor Fernando Lima é uma forçada operação cosmética, para limitação de danos na imagem de Cavaco Silva.

Ou, não o sendo, o Presidente encobriu conscientemente, ao longo de todo este tempo, um comportamento gravíssimo do seu assessor, e só após o escândalo que resultou da publicação do DN, se viu obrigado a demiti-lo.

Seja como for, é suposto que a Instituição que representa a Chefia de um Estado tenha um comportamento confiável, sério e digno.

Mandar fazer intriga política com orgâos de comunicação social "amigos", ou encobrir intriguistas que semeam informaçãoes falsas e insinuações, para atingir outras Instituições do Estado nem é sério, nem é digno e retira a este Chefe do Estado a credibilidade e respeitabilidade que o cargo naturalmente exige.

domingo, setembro 20, 2009

Jornais e política

O caso da "vigilância" sobre a Presidência da República parece ter diariamente novos desenvolvimentos.

Após o próprio Provedor dos Leitores do "Público", Joaquim Vieira, ter criticado a actuação do seu jornal, admitindo a possiblidade de o "Público" ter uma agenda política oculta, o mesmo Provedor avança hoje, em nova intervenção, com factos que merecem ser conhecidos.

Transcrevo apenas uma parte do texto que entretanto poderá ser encontrado no Blog do Provedor do Leitor do Público:

"Na sequência da última crónica do provedor, instalou-se no PÚBLICO um clima de nervosismo.

Na segunda-feira, o director, José Manuel Fernandes, acusou o provedor de mentiroso e disse-lhe que não voltaria a responder a qualquer outra questão sua.

No mesmo dia, José Manuel Fernandes admoestou por escrito o jornalista Tolentino de Nóbrega, correspondente do PÚBLICO no Funchal, pela resposta escrita dada ao provedor sobre a matéria da crónica e considerou uma “anormalidade” ter falado com ele ao telefone.

Na sexta-feira, o provedor tomou conhecimento de que a sua correspondência electrónica, assim como a de jornalistas deste diário, fora vasculhada sem aviso prévio pelos responsáveis do PÚBLICO (certamente com a ajuda de técnicos informáticos), tendo estes procedido à detecção de envios e reenvios de e-mails entre membros da equipa do jornal (e presume-se que também de e para o exterior).

Num momento em que tanto se fala, justa ou injustamente, de asfixia democrática no país, conviria que essa asfixia não se traduzisse numa caça às bruxas no PÚBLICO, que sempre foi conhecido como um espaço de liberdade."

Estes factos, trazidos a lume por Joaquim Vieira, na sequência de tudo o que já se conhece, parecem ser elequentes face a posturas deontológicas e políticas existentes no jornal PÚBLICO.

Neste contexto, parece-me igualmente ser interessante a entrevista que José Miguel Júdice hoje concedeu à jornalista Marina Marques, do Diário de Notícias, e que aqui transcrevo na totalidade:

A revelação por parte do DN do e-mail trocado entre Luciano Alvarez e Tolentino Nóbrega, jornalistas dos Público, é uma violação de privacidade?

Não sei se o e-mail é privado ou se tem interesse público. Acho muito curioso que a imprensa portuguesa, que durante anos e anos não se preocupou com a revelação de escutas, agora que atinge os jornalistas, estes comecem a ficar preocupados.

Considera reprovável, do ponto de vista ético?

É deontologicamente censurável, mas, durante anos, os jornalistas aceitaram que isso fosse possível em muitas situações que não envolviam jornalistas. É como se estivessem a provar um pouco do seu remédio.

Os jornalistas dão muita importância a si próprios. Eticamente, é inadmissível que os jornalistas queiram ser protegidos de uma forma que não se protegem os outros cidadãos.

A relação entre jornalista e fonte descrita no e-mail é...

… de uma gravidade extrema. E se é exemplo da forma como se faz jornalismo neste País, estou como Manuela Ferreira Leite: Não quero viver neste País. A aceitação da instrumentalização por parte do jornalista, se for verdade o que está no e-mail, é lamentável.

Perguntas sugeridas por um assessor, fazer a notícia sair da Madeira...

Considera aceitável que o DN tenha divulgado o e-mail?

É importante que o Diário de Notícias tenha divulgado esta situação.

E é importante que os jornalistas ponham a mão na consciência.

Eu sou amigo do José Manuel Fernandes, mas a reacção do José Manuel Fernandes, que de manhã afirmou que o Público estava sob escuta e depois vem reconhecer que, afinal, não houve qualquer intrusão no sistema informático do jornal, é de uma gravidade absoluta. E nem pediu desculpa.

Depois das suspeições lançadas devia de haver um pedido de desculpa ao País, a todos nós. A comunicação social deve pôr a nu estes métodos de fazer jornalismo.

Se é grave o que Fernando Lima, assessor do Presidente da República, fez, também é grave a comunicação social sujeitar-se a isso.

A revelação deste caso desacredita o jornalismo?

Sobretudo levanta algumas questões: será caso único? Não haverá mais fretes entre políticos e jornalistas?

A partir deste caso, os jornalistas deveriam aproveitar para fazer uma reflexão, com muita coragem, para estigmatizar práticas profissionais inadmissíveis. Enquanto bastonário da Ordem dos Advogados fiz isso junto dos advogados. Acho que é essencial que assim seja em qualquer actividade.

O interesse público justifica a publicação do e-mail?

Está tudo a arrancar os cabelos porque é um jornal a fazer a outro jornal aquilo que é prática da comunicação social fazer a outras entidades não jornalísticas: publicar e revelar documentos, mesmo que protegidos pelo segredo de justiça, em nome do interesse público. Esta dupla ética não é aceitável.

Há uma prática muito comum nos países civilizados que é a de os vários orgãos de comunicação social manifestarem explicitamente as suas opções políticas e partidárias, e as suas declarações de interesses relativamente ao poder económico.

Em Portugal existe o mito do jornalismo independente... O que é uma completa hipocrisia!

Ninguém é neutro perante a vida e mundo! Todos temos as nossas opções e opiniões, e os jornalistas, directores e proprietários dos orgãos de comunicação social também as têm! Naturalmente!

Essas opções e opiniões até podem variar, oscilando com o tempo, como acontece com os jornais ingleses, franceses ou americanos, só para citar alguns dos países com imprensa mais conhecida entre nós .

Mas é precisamente essa capacidade de oscilação e de alteração de posição política de jornais, rádios e televisões que transmite um verdadeiro sinal de independência do jornalismo face aos vários poderes! E de transparência junto do público.

Neste País, infelizmente, ningém parece ter a coragem de dar esse passo, como se houvesse uma conveniência muito profunda em não o fazer.

A consequência previsível é a de que, mais dia, menos dia, teria que surgir o odor da podridão, que resulta da promiscuidade e conivência entre os meios informativos, os partidos e instituições...

O espectáculo que neste momento se está a assistir, ainda sob a insistente máscara da independência jornalistica, constitui um verdadeiro atentado à seriedade da democracia e da liberdade de informação, que é preciso esclarecer até ao fim, para que haja o mínimo de salubridade na nossa vida em sociedade!

Se algum benefício vier a ter esta confusa situação criada entre o poder e os jornais é o de destapar, junto dos mais desprevenidos, essa máscara!

sábado, setembro 19, 2009

Presidente



Trago aqui duas citações (parciais) na comunicação social de hoje, a propósito de uma "encomenda" que um assessor presidencial teria feito a um jornalista do Público, entregando-lhe inclusivé um dossier sobre um assessor do Governo:

A primeira do Director do Diário de Notícias tem o título UM SILÊNCIO SUSPEITO (parte II):

"Numa Presidência da República nunca há 'fontes'.
Há factos, comentários ou opiniões, que um Presidente, em certas alturas, quer tornar do domínio público sem se comprometer por via oficial, nem sequer com uma nota.
E há colaboradores para executarem a vontade e a estratégia do Presidente. Quando não o fazem, obviamente passam imediatamente a ex-colaboradores.
É por isso que o silêncio de Cavaco Silva pesa sobre a actual suspeita de pseudovigilância ilegal às comunicações dos seus assessores por parte de 'alguém' do gabinete de José Sócrates" ("Um silêncio suspeito", escrito a 22 de Agosto)
"É absolutamente condenável a estratégia da Presidência da República nesta questão. Ou a notícia é falsa e já deveria ter sido desmentida; ou a notícia corresponde ao que o Presidente pensa e só poderia ter duas consequências: queixa na Procuradoria e demissão do Governo" (Idem)


"1. As críticas que aqui fiz ao comportamento político do Presidente da República (PR) no caso das alegadas escutas de São Bento a Belém mantêm-se não só actuais como até ganharam uma outra dimensão e gravidade com a notícia publicada ontem pelo Diário de Notícias.

A reacção de Cavaco Silva é preocupante para a democracia portuguesa.

O PR, mais uma vez, não se demarcou da tarefa de que terá incumbido o seu assessor (que se tivesse exorbitado deveria estar já sumariamente despedido). Antes pelo contrário, afirmou, de forma clara, que vai "averiguar questões de segurança" depois das eleições.

Estas palavras são contraditórias com a afirmação de que não pretende influenciar o período eleitoral. Além do mais, escondem uma outra hipocrisia: se o PR não queria influenciar, porque utilizou o assessor para dar uma "notícia" em vésperas das eleições?

Um PR não se pode prestar a estes papéis. Ou tem certezas e age, com coragem; ou não tem certezas, e averigua calado. Ora Cavaco Silva não apresentou nenhuma queixa na Procuradoria, não pediu esclarecimentos ao SIS, não demitiu o Governo. De forma irresponsável, permitiu mesmo que se acendesse a fogueira da dúvida.

2. Enquanto não negar responsabilidades pessoais no comportamento do seu colaborador de 20 anos, o PR é suspeito de acusar sem provas, de lançar a instabilidade no País.

Acresce um outro aspecto: depois de 27 de Setembro, data em que começará a "averiguar", já estará eleito um outro primeiro-ministro, que pode ser o mesmo, legitimado pelo voto popular apesar das suspeitas presidenciais sobre ele. Esta não é uma questão de pormenor. Vai com certeza introduzir ainda mais instabilidade num quadro partidário que pode não vir a ter uma solução estável para quatro anos.

Pessoalmente, confesso-me surpreendido. Reconheci sempre em Cavaco Silva uma autoridade moral que me parecia um importante resguardo para o Estado português - e agora não sei que pensar. Eu e, com certeza, muitos cidadãos."



A segunda, de Emídio Rangel, do Correio da Manhã e tem como título A CONSPIRAÇÃO:

"[...] é um facto que a “inventona” das escutas a Belém foi gerada, na Presidência da República, por Fernando Lima, um homem-forte do Presidente e utilizou o jornal Público, dirigido por José Manuel Fernandes, que agora abandona o barco, ao que se diz, para se juntar ao staff do Presidente da República.[...]

Se se confirmar (é necessária a reconfirmação de tudo) tudo o que ficou agora jornalisticamente provado e se, em tempo útil, o Presidente da República não se pronunciar sobre o assunto, mostrando-se à altura do cargo e das responsabilidades que os portugueses lhe confiaram, não há outra saída que não seja a resignação.

O Presidente da República está “acusado” de promover uma conspiração contra outro órgão de soberania, enquanto prega a cooperação institucional entre Belém e S. Bento. Ou prova, ou se demarca, sem equívocos, ou resigna, porque feriu de morte a confiança dos portugueses e já não pode continuar a ser o garante do regular funcionamento das instituições democráticas.

Quem adopta estas práticas perde todas as hipóteses de continuar a exercer uma magistratura de influência na sociedade e não será mais aceite como Presidente de todos os portugueses. O assunto é muito grave. [...]»

quinta-feira, setembro 17, 2009

A minha opção

Regressei à poucos dias da Polónia e aproveito para agradecer as mensagens amigas e generosas que entretanto recebi



Ao ter chegado embati naturalmente na campanha eleitoral e portanto na polémica à volta do TGV.

Curiosamente, na Polónia, encontra-se em fase adiantada a construção do TGV e, face aos argumentos que aqui tenho ouvido, sinto-me no meu País a viver dias de absurdo e de pura hipocrisia política.



Mandaria a prudência que o assunto TGV, que naturalmente merece ser discutido, não fosse agora utilizado como arma de campanha política, até porque um dos partidos envolvidos, o PSD, se apresenta nestas eleições com o slogan “Política de verdade”.

O facto é que, das relações internacionais às leis laborais, das medidas sobre a justiça às ambientais, das urbanísticas às da saúde, das agrícolas às de educação, da justiça social aos apoios sociais, há todo um mundo de coisas importantes a discutir que, por causa do TGV, ficaram completamente nas zonas sombrias desta campanha.

E se assim é…. Vou também eu meter a minha modesta colherada neste assunto.

E começo por referir que se relembrei aqui o slogan “Politica de verdade” do PSD foi porque o Governo, em que Manuela Ferreira Leite era a Ministra das Finanças, após ter acordado com o Estado Espanhol a construção de várias linhas de TGV, produziu em 26 de Junho de 2004 uma Resolução do Conselho de Ministros, que merece ser vista agora com toda a atenção.




Essa Resolução que pode aqui ser consultada encontra-se publicada no Diário da República e nela encontram-se previstas 5 linhas de alta velocidade, sendo explicado o seguinte:

A rede ferroviária de alta velocidade assume-se como
um projecto de investimento estruturante que permite
o desenvolvimento de competências empresariais próprias,
assegurando a participação de empresas e indústrias
locais nas diversas fases do projecto incluindo execução
e operação, contribuindo para o crescimento do
produto interno bruto e induzindo a criação de emprego
sustentado, factor decisivo da coesão social do País.”


E na verdade, apesar de a tecnologia sobre a qual assenta o TGV não ser nacional, de acordo com os estudos da altura, e que hoje ainda se mantêm válidos, cerca de 85% do equipamento pode ser produzido pela indústria do nosso país!

Por isso mesmo, a simples construção do TGV, levava o Governo em que Manuela Ferreira Leite era Ministra das Finanças a afirmar que essa obra iria movimentar fortemente o tecido empresarial português, podendo, só por si, elevar anualmente o PIB em mais de 1,7 pontos percentuais, o que resultaria num aumento de receitas fiscais bastante considerável, num efeito catalizador do desenvolvimento do País (até pelo acesso a novas tecnologias) e até numa diminuição de assimetrias regionais!

Isso mesmo encontra aqui desenvolvido nesta notícia da época.

Estranho muito, por isso, que a líder do PSD venha agora dizer que o “TGV é enfeite de novo-rico” e que o “País está endividado e quer uma coisa de que não precisa”.

Afinal quando é que Manuela Ferreira Leite estava a revelar verdadeiramente o seu pensamento sobre a utilidade do TGV?

Antes, quando preparava o argumentário para que Durão Barroso nos garantisse que o TGV era excelente para o País?

Ou agora, como líder do PSD, em que diz que o TGV é uma desgraça desnecessária



A explicação que Manuela Ferreira Leite dá para a sua mudança de opinião, quer sobre a utilidade, quer sobre a oportunidade deste empreendimento, radica, segundo ela, no actual nível de endividamento externo do País, problema que diz resultar da incompetência de Sócrates.

Assim sendo, falemos então, sobre o tal endividamento:

Como todos sabemos a origem do endividamento externo português está no seu tradicional défice comercial: Importamos mais do que exportamos!.

Acresce que, infelizmente, Portugal não é produtor de petróleo, o que torna esse défice crónico e quase inevitável, dado o perfil das nossas exportações.

Mais de metade das importações portuguesas são de combustíveis, e o que o Manuela Ferreira Leite deliberadamente omite é que nos últimos 3 anos anos o preço da parcela mais importante das nossas importações – o petróleo - cresceu 3 vezes!!





Será que MFL nos está a querer convencer que Sócrates poderia alguma vez controlar o preço do petróleo nos mercados internacionais? A dita incompetência afinal só poderia provir daí!

MFL esquece-se ainda de dizer que, apesar desse nível excepcional de crescimento do preço do petróleo, o rácio de endividamento face ao PIB passou de 64% em 2003 para 95% em 2008, o que significa que, apesar de tudo, Portugal conseguiu diminuir o impacto desse aumento de preço no nosso endividamento de 125% para 48%.

Vale a pena referir que as razões desse amortecimento do impacto foram várias, e justiça seja feita, se deveram a políticas internas! Realço duas:

Uma, ainda de importância financeira reduzida, mas extremamente relevante como indicação de caminho futuro traduz-se na aposta nas energias renováveis lançadas pelo Ministério da Economia, que permitiram já reduções nas importações de hidrocarbonetos.

Outra, de maior relevância financeira, foi sem dúvida a pesada e desagradável política fiscal de tributação dos combustíveis, que tiveram um efeito significativo na redução da procura e portanto da factura energética.

Trata-se aliás de uma política tão pesada e tão desagradável que o PSD e o CDS se fartaram de protestar contra ela…

Ora se o Governo tivesse seguido os “conselhos” destes partidos, aliviando a carga fiscal para que o transporte rodoviário se continuasse a fazer ao mesmo nível, o que aconteceria?

Aconteceria que o nosso endividamento estaria não nos 95% de que a Dra. Manuela se queixa, mas dispararia no mínimo para 120% do PIB. E aí sim, o rating financeiro do País desceria às ruas da amargura, com todas as consequências para o custo do dinheiro para os nossos bancos, empresas e famílias!

Bom, mas voltando ao argumento de Manuela Ferreira Leite, será que o actual nível de endividamento face ao PIB é algo de tão aterrador que iniba os investimentos grandes investimentos propostos?

Esquece também aqui a Dra. Manuela que se trata de investimentos faseados no tempo e comparticipados pela União Europeia. Mas parece que para a Dra. Manuela a diluição no tempo ou a concentração temporal dos gastos orçamentais são uma e mesma coisa, e que as comparticipações de muitos milhões são irrelevantes....

Por outro lado, quanto ao efeito nas condições internacionais de crédito, a verdade é que excepto uma agência de rating, a tal, tão credível, que dava à Islândia a sua cotação máxima em vésperas de bancarrota, as duas outras agências de rating não baixaram o ranking do Estado Português, que se situa ainda no nível AA !

E mesmo essa agência, tão considerada pela Dra. Manuela, a S&P, colocou o nosso País, ao mesmo nível da Espanha, Irlanda, Grécia e Itália entre outros países da União!



Acresce ainda que essa indicação de rating que serviu de pretexto a Ferreira Leite para a sua cruzada anti-TGV, se refere a 2008 e que, entretanto, desde Março deste ano, os indicadores de referência, que utilizam como padrão a dívida pública alemã, vêm aproximando os da divida portuguesa aos da dívida germânica, o que significa uma proximidade de Portugal aos parâmetros do padrão mais elevado de confiança.

Manuela Ferreira Leite, deve sabê-lo, mas prefere omiti-lo.

É esta a “Política de verdade”? Ou será que se prepara, caso ganhe as eleições para, poucos meses depois, declarar que o problema do endividamento foi resolvido por ela e que por isso já poderemos voltar a pensar em TGV!

Sinceramente, compreendo a posição de todos aqueles que sempre foram contrários ao TGV por acharem que ele não seria necessário, em termos de expansão ferroviária e de ligações ao centro da Europa. Contudo, no que se refere a Ferreira Leite, fica claro que as suas motivações, pouco têm que ver com convicções ou com a verdade. Têm que ver apenas com um enorme apetite pelo poder…

Quem leu alguns dos posts que aqui coloquei sobre política nacional percebeu claramente que não sou um apoiante de José Sócrates, mas neste caso, concordo em absoluto com ele quando refere que a atitude de Manuela Ferreira Leite é uma atitude retrógrada, uma atitude do passado.

Manuela Ferreira Leite joga sem pudor com alguns factores que crê poderem dar-lhe alguns dividendos políticos.

Em primeiro lugar deve considerar que para além de memória curta, o povo português não tem inteligência.

Em segundo lugar omite dados, manipula conceitos e números crendo que somos todos ignorantes, possivelemente na convicção de que a Economia é seu território exclusivo!

Em terceiro lugar, revelando uma faceta bastante perigosa e irresponsável, utiliza de forma atabalhoada, como factor de mobilização popular, o apelo a sentimentos primários face a imaginários adversários externos.



Neste caso, procurou tirar do baú o sentimento anti-espanhol, como se os eleitores fossem garotos acabados de sair da aula de História onde se aprendeu que Miguel de Vasconcelos foi defenestrado por estar feito com os castelhanos, e que D. Luísa de Gusmão, que por acaso era uma espanhola dos quatro costados, se saiu com a patriótica tirada “Mais vale ser rainha uma hora que duquesa toda a vida” !

Chamar baixa política aos argumentos de Ferreira Leite, que ainda não há muito tempo foi administradora não executiva de um banco espanhol, não é por isso insulto, é o corolário lógico de quem tem alguma memória, algum conhecimento dos factos e tem o mínimo de senso!

Termino lembrando o seguinte:

Apesar dos primeiros projectos para a construção do Metro de Lisboa serem de 1888, apesar de várias linhas na Europa se terem iniciado na transição do século XIX para o século XX e apesar de se ter percebido, desde sempre, a vantagem deste meio de transporte, em termos de qualidade de vida e ordenamento urbano, só em 1959 e depois de 13 outros países da Europa já o terem feito, é que Portugal inaugurou a sua pequena linha de Metropolitano.



Depois de a Alemanha ter sido pioneira na Televisão em 1935 e de o Reino Unido e a França a terem imitado nos anos seguintes, depois de as emissões a cores se terem iniciado em 1954 nos Estados Unidos, Portugal, só em 1957, com um Salazar bastante contrafeito, iniciou emissões televisivas regulares, atrás de quase todos os países europeus e mesmo de vários da América Latina.




Esses foram os tempos em que o Banco de Portugal acumulava barras de ouro e o País era o mais pobre e atrasado da Europa. O Pais onde ainda circulavam carroças nas ruas de Lisboa e a modernidade chegava com décadas de atraso.

Eram os tempos de Salazar cuja fixação, em termos financeiros, era a do equilíbrio orçamental e do défice zero. Ainda que para isso (quase) todos tivessemos que viver numa apagada e vil pobreza…

Manuela Ferreira Leite diz agora que para ela um Estado Moderno é um Estado Rico e que para isso parará o programa de obras públicas que o actual governo propõe….

É uma frase muito infeliz, pouco lúcida, que remete para um modelo passado que julgava não voltar a ver repetido…. Mas que, vindo de quem vem, já não me surpreende, face a tantas afirmações infelizes já proferidas sobre outras matérias…

Sendo realista, analisando o que vejo e oiço, face aos dois únicos possíveis candidatos a Primeiro-Ministro direi, como disse ontem Adriano Moreira que desta vez temos que optar por um mal menor (bom, ele foi um pouco mais duro e disse literalmente que iria votar no menos péssimo…)!

Eu, no próximo dia 27 irei votar PS… A perspectiva de ter Manuela Ferreira Leite como Primeira-Ministra deixa-me verdadeiramente aterrorizado!