quarta-feira, maio 14, 2008

Mirene e Marina

Depois de há uns dias atrás ter trazido ao blog algumas canções da Madalena Iglésias, resolvi hoje falar um pouco de duas cançonetistas que deixaram há muito de se ouvir…

E lembrei-me delas porquê? Porque ontem a RTP1 estreou ontem uma rubrica no final do Telejornal, em que abordou a problemática do cancro da mama, tendo entrevistado algumas figuras públicas que tiveram este problema.

Entrevistaram Simone de Oliveira, tendo posto uma canção sua, como música de fundo. Chamava-se essa canção Fúria de Viver.

Entrevistaram também Tonicha e fizeram o mesmo, colocaram como fundo musical uma canção criada por Tonicha, chamada Fui ter com a Madrugada, contudo a voz não era a de Tonicha… Essa voz era de Mirene Cardinalli.



Tratava-se de uma canção que valeu a Tonicha o 2º lugar no Festival da Canção de 1968, a escassos 2 pontos de Verão de Carlos Mendes.

Penso que terá sido uma gaffe da edição do programa, repetindo o erro que aliás já vi há algum tempo em alguns blogs.

Bom, o certo é que com isto a voz de Mirene voltou felizmente a ouvir-se na televisão portuguesa.

E ao lembrar-me de Mirene, recordei igualmente Marina Neves.

Ambas morreram muito jovens e ambas, curiosamente, tinham um estilo e um timbre muito semelhante, que na altura, alguns críticos consideravam pouco original, dado que ambas se assemelhavam, talvez em demasia, a Simone de Oliveira, que na época era a voz feminina mais conceituada



Mirene Cardinalli (da família dos proprietários do Circo Cardinalli) nunca negou as semelhanças com a criadora da Desfolhada, mas recordava ter começado a cantar muito jovem, ainda antes de Simone, e de ter tido sempre o mesmo estilo.

Fez parte da sua carreira em Angola, para onde havia partido no início dos anos 60 e onde teve enorme sucesso. Quando regressou, em 1967, conseguiu rapidamente impor-se na “Metrópole”, sendo as suas canções: Mal de Amor, Julgamento, Livro Sem Ter Fim, Adeus ao Verão e Canção do Novo Sol, repetidas diariamente nas rádios.

Esta notoriedade permitiu-lhe participar no ano seguinte, a par de Tonicha e Simone, no Festival RTP com a canção Vento Não Vou Contigo.




Infelizmente a sua carreira não durou muito mais, no dia 19 de Dezembro de 1969, a caminho de Évora, um acidente trágico tirou a vida a Mirene Cardinalli e a outros colegas que a acompanhavam (salvou-se apenas, apesar de ter ficado muito ferida, Maria de Lourdes Resende). Mirene tinha 27 anos.

A carreira de Marina Neves ainda foi mais curta.

Tendo-se iniciado no Centro de Preparação dos Artistas da Rádio, no inicio dos anos 60, tornou-se particularmente notada, quando a editora Alvorada, resolveu em 1964 editar as canções do Festival desse ano, por vozes diferentes das dos criadores.

Marina Neves foi escolhida para cantar Olhos nos Olhos, e fê-lo numa colagem tão precisa à versão original de Simone de Oliveira, que foi com um misto de surpresa e de crítica que foi recebida a sua interpretação. A polémica daí resultante foi quanto bastou para que se tornasse de imediato uma cantora requisitada.




Marina Neves, jovem muito bonita e bastante simpática, tornou-se figura indispensável dos Serões para Trabalhadores , tendo feito sucesso nesses e em todos os outros espectáculos em que participou.

A sua voz e expressividade em palco tinha potencialidades que infelizmente não pode desenvolver.

Uma doença oncológica, poucos meses depois, afastá-la-ía dos palcos e tirar-lhe-ia a vida.

As canções que deixou gravadas testemunham a sua qualidade vocal, apesar de, no entanto, estarem muito aquém do que ela merecia. A sua morte, prematura, com pouco mais de 20 anos provocou na altura, uma verdadeira comoção nacional.

Tal como sempre acontece, tão forte foi a comoção, quão rápido foi o esquecimento.

Mas tudo isto veio a propósito de uma canção de Tonicha e de uma gaffe (espero não estar a ser injusto) da RTP.



Terminemos pois com esta canção quer originou estas minhas recordações. É do Festival de 1968 e nela teremos Tonicha vestida com um fato curiosamente parecido com o que Cliff Richards usaria poucas semanas depois no Festival da Eurovisão:

16 comentários:

  1. Curiosamente, e com alguma surpresa minha, não recordo nenhuma das duas cançonetistas, que tê, concordo contigo, muitas semelhanças sonoras com a Simone.
    A carreira de ambas foi curta e como dizes o esquecimento é rápido...
    Abraço.

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  2. Caro "Pinguim"
    É perfeitamente natural o esquecimento de aconteceimentos, de coisas e de pessoas que um dia passaram pela nossa vida. É pena, mas é assim a vida.
    Depois tudo é tão efemero!!! Eu creio, contudo, que a verdadeira morte acontece, quando já mais ninguém se lembra das pessoas.
    E por isso, eu procuro assim, dar o meu pequeníssimo contributo para adiar um pouco algumas mortes que, em todo o caso, serão inevitáveis.
    Gostaria que as editoras discográficas, como principais guardiãs das memórias sonoras, pusessem, de vez em quando, de lado os objectivos financeiros imediatos e contribuissem mais para preservar o património comum da história da nossa música.
    Creio que há sempre quem, das novas gerações, esteja disponível para poder receber o testemunho destas recordações. Pelo menos é a minha esperança....

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  3. Estimado Amigo:
    Apesar de viver a minha infância ainda recordo o Festival Da Canção da RTP que gerava um interesse desmedido. Ninguém o perdia. Juntava-se toda a família em volta da televisão em silêncio e deliciava-se com a voz e a disputa aguerrida e fascinante pelo primeiro lugar, que dava acesso ao Festival a nível Europeu.
    Sem dúvida que ao dar-lhe viva voz me fez relembrar de forma comovente esses maravilhosos tempos.
    Brilhante, amigo.
    Eles e elas agradecer-lhe-ão, acredite?
    Um Bem-Haja de amizade.
    Adorei!
    Abraço cordial e de consideração

    pena

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  4. Muito interessante , o post.
    Particularmente, porque acompanhei tudo quanto refere de perto.
    Ainda recordo a maneira incorrecta como a multidão se comportou no funeral de Marina.
    Bem haja!

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  5. Vim aqui para agradecer a visita que me fez.
    E agradeço MESMO, já que me permitiu conhecer este blog, que considero muito bom!
    Vou voltar com mais tempo, pois apenas vi o post "Mirene..." e o anterior, mas deu para perceber que há aqui muito material digno de ser apreciado.
    Em relação à última postagem pouco posso dizer. Quando esses acontecimentos decorreram eu estava ausente do país (em terras de além-mar...). Mas recodo-me muito bem da voz que TINHA Simone, e sem dúvida que as vozes de Mirene e de Marina são cópias fiéis, (ou vice-versa...)pelo que me foi dado ouvir aqui. Gostei muito.
    Um abraço
    Mariazita

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  6. interessante esta pesquisa que tira do baú informações interessantes...fico à espera de mais e de mais nomes que ficaram de certo modo na penumbra.

    Obrigado

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  7. Que pareça haver alguma generalização na confusão entre a Tonicha e a Mirene Cardinalli, ainda posso compreender. Que a RTP embarque nessa confusão é que já acho muito estranho. Fico com a ideia que nesta rubrica do Telejornal alguém terá optado pelo caminho fácil de "copiar pelo parceiro do lado" (que ainfa por cima estava errado) do que em fazer o trabalho para o qual é pago!!
    Pena a Tonicha não ter reclamado! A César o que é de César!!

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  8. Caro Amigo Pena
    Obrigado pelas suas palavras.
    Uns mais novos, outros já mais avançados na idade, o que é certo é que vimos ainda todos de um tempo em que os Festivais da Canção eram verdadeiros acontecimentos.
    Recordá-los e recordar muitas das suas figuras é pois revisitar tempos e vivências que trazemos na memória e no coração.
    A mim pessoalmente faz-me bem!
    Um abraço de consideração e amizade.

    Cara São
    A verdade é que, mesmo em termos de filosofia de vida, me custa aceitar que o destino final de uma pessoa seja o esquecimento e o silêncio absolutos.
    Sei que esse será o destino inevitável, mas procuro, com um modesto contributo, manter algumas luzinhas acesas para quem com a sua arte, ajudou a tornar mais alegres e mais belos alguns dos nossos dias passados...
    Será a minha forma de lhes dizer obrigado.

    Cara Mariazita
    Foi e é um prazer visitar a sua "Casa da Mariquinhas", um espaço muito bem feito e cheio de interesse.
    E é com muito gosto que a vejo por aqui.
    Grato pelas suas palavras tão simpáticas.
    Tenho algumas memórias que já vai sendo tempo de partilhar com quem possa estar interessado nos mesmos assuntos que eu e tenho também algumas observações sobre algumas coisas que vão acontecendo nesta terra.
    Ou seja, este espaço é uma miscelânea que espero que faça algum sentido.
    Bem-haja.
    Um abraço

    Caro Amigo Luís Galego
    Há infeliz e injustamente muitos artistas portugueses que, apesar da sua qualidade, foram ficando esquecidos.
    Há ainda alguns artistas estrangeiros, aos quais os nossos meios de comunicação também não dão qualquer importância.
    De alguns eu guardo memórias ou possuo informações.
    È óbvio, no entanto, que muitos mais existirão e que ficarão decerto muitos tesouros por recuperar.
    Neste pequeno baú ainda existem alguns... Haja tempo e ficarão à disposição de todos.
    Um abraço

    Caro Amigo Diz_traído.
    Ou foi distração da RTP (para não dizer mau profissionalismo), ou então foi mesmo uma pequena "Traição" que foi feita à Tonicha.
    De qualquer forma, há males que vêm por bem. Há dezenas de anos que não ouvia a Mirene na RTP1.
    Um abraço amigo

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  9. Pois eu só quero dizer obrigada.
    O meu nome é Filomena cardinali e sou filha da Mirene.
    Infelizmente como dizem muitos se esqueceram dela, mas para muitos ainda, ela é eterna.
    Para o ano faz 40 anos que se aninhou numa nuvem e adormeceu..muitas vezes acorda para olhar os dois filhos e os 2 netos que tem.. que a amam e admiram.
    Bem haja
    Um abraço
    Filomena Cardinali

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  10. Cara Filomena Cardinalli

    O seu comentário, que me apanhou de surpresa, deixou-me muito comovido, pois eu fui, sou e serei um grande admirador de sua Mãe.

    Já em Dezembro de 2006, no início deste meu blog tinha dedicado um pequeno post a Mirene Cardinalli.
    Poderá vê-lo em
    http://in-senso.blogspot.com/2006/12/lembranas.html

    Tem pois toda a razão no que diz, para mim e para muitos outros seus admiradores Mirene Cardinalli é eterna, e nessa medida, é com alegria que vamos passando a mensagem aos mais novos para que as memórias não se percam.

    Recordo-me bem de ver a sua Mãe em programas de televisão, de a ouvir em programas de Rádio. Lembro-me de ouvir e ler entrevistas que deu e da impressão com que ficava de que se tratava de uma pessoa que apesar de jovem era muito ponderada e consciente de que os vedetismos não levavam a nada.

    Ficou-me também na memória a insistência com que os seus discos eram pedidos na rádio.
    Lembro-me do silêncio que se fazia na minha casa quando a Rádio passava a canção "Julgamento".

    A sua Mãe tinha um talento excepcional, que felizmente posso recordar quer através da colectânea saída em CD, quer do pequeno 45 rotações que também possuo (exactamente o da canção Julgamento, de que tanto gostamos).

    Um talento raro, que decerto muito deve honrar os seus filhos e netos.
    Infelizmente, Deus de vez quando gosta de levar, muito prematuramente, os melhores para junto de si.

    Permita-me que lhe diga que também em nós existe uma grande saudade de Mirene Cardinalli.

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  11. Com os meus 61 anos de idade, mal pareceria se dissesse que não me recordo da Mirena Cardinali e da Marina Neves. Principalmente a última vem-me muitas vezes à memória com imensa tristeza e saudade, pois subitamente após o seu triste desaparecimento, a sua voz como que se apagou também. E isso não é justo. Desde há muitos e muitos anos que eu procuro discos da Marina sem qualquer resultado, sempre na esperança de poder voltar a ouvir a sua interpretação do "lado a lado", que eu tanto gostava de ouvir e inexplicávelmente nunca mais ouvi pela voz dela. Nunca deixei de procurar e rebuscar em estabelecimentos de venda de discos antigos e até feiras de antiguidades, mas sem resultado. E dói-me ver a ignorância dos meus interlocutores ao responderem que "nunca ouviram falar". O nosso património cultural está mesmo de rastos, somos um povo que se vai descaracterizando.
    Obrigado por esta agradável surpresa, parabéns pelo blogue, e prometo que vou passar a fazer visitas assíduas.

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  12. Caro Condor

    Grato pela sua visita e pelas suas palavras.
    Cada vez sinto mais pena que as memórias se vão perdendo e que tanta coisa de qualidade fique no esquecimento e não chegue ás gerações mais jovens.
    Entendo que a minha geração ao lançar-se nesta aventura que são os blogs tem obrigação de recordar certas coisas.
    Marina Neves merece sem dúvida ser recordada, tal como Mirene ou Maria Marize, ou.... tantas e tantas outras, que fizeram história na nossa música
    Um abraço

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  13. Até que enfim.... encontro o nome da Marina Neves e sabem quem é ! Já começava a pensar que apesar de ter só 60 anos, estava senil ou era uma alegoria minha. Que triste fiquei e ainda tenho na memória enxertos do seu funeral! Comoveu-me muito ter partido tão jovem... Que Deus a tenha em paz, e obrigada pelos momentos que me delicie a ouvi-la cantar.....
    "Toda a minha vida sonhei este dia,
    De branco vestida cheia de alegria
    Sobre a cor trigueira de um rosto corado
    Flores de larangeira, e um véu de noivado" etc. etc.

    Maria Augusta Antunes - Tomar

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  14. Cara Maria Augusta

    Obrigado pelo seu comentário e ao verificá-lo, constatei com tristeza que as canções que coloquei foram retiradas pelo operador do site respectivo. Procurarei brevemente colocar essas canções no youtube!
    Afinal talvez seja a melhor forma de as preservar e dar a conhecer!

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  15. Tal como a minha mãe o fez há algum tempo, também eu quero somente agradecer por manter viva a memória da minha avó, Mirene Cardinali, uma mulher que infelizmente não conheci, mas que também não poderia amar mais caso isso tivesse acontecido. Obrigada por me ter transportado para um tempo que não vivi, em que havia silêncio em algumas casas como a sua, na altura em que a minha avó tocava na rádio, canções como 'julgamento'.

    Um obrigada grato,
    Andreia Cardinali

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  16. Cara Andreia

    Deixou-me naturalmente muito sensibilizado com o seu comentário.

    Procuro neste meu modesto espaço recordar alguns dos nomes mais marcantes do mundo da música portuguesa e mundial.

    E creia-me, que não é por mero acaso que recordei aqui e já em dois outros posts a magnifica artista que foi Mirene Cardinalli (o último foi precisamente em Dezembro passado, quando passaram os 40 anos do tragico acidente que vitimou seus avós).

    Como já havia dito anteriormente, para quem gosta de música, para quem a vive com paixão, é não só um prazer, mas também um dever, levar ao conhecimento dos mais jovens o que de melhor aconteceu musicalmente em tempos mais recuados, para que eles não percam a oportunidade de o conhecer.

    Se alguém tem que estar grato serei eu e todos os que passámos momentos muito felizes ao escutar a voz maravilhosa de sua Avó Mirene.

    Recordá-la aqui, num blog que pretende falar de música e de artistas com qualidade, é o mínimo que poderia fazer.

    Um bem-haja para si e para sua Família.

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